Bem vindos à minha fábrica de sonhos!

sábado, 5 de março de 2011

The Big Machine 3 - O Último Apocalipse


Para Beatriz Albarado,
Fabíola Maciel,
Pedro Henrique,
e Rayanne Cordeiro,
Com todo amor e carinho.
Sem vocês, nada disso seria possível, obrigado por tudo.

•••

And I never was smart with love
I let the bad ones in and the good ones go
But I'm gonna love you like I've never been hurt before
I'm gonna love you like I'm indestructible
Your love is, oh, too magnetic
And it's taking over
This is hardcore
And I'm indestructible


Indestructible – Robyn



- Você sabe o que quer dizer Apocalipse? – perguntou Maxine, mexendo nos cabelos escuros e cacheados da pequena Kátia. Era uma noite linda, limpa e enluarada, as constelações brincavam no céu escuro como crianças travessas, se mostrando através da claraboia do último andar, saltando para dentro dos olhos curiosos de mãe e filha. Dois anjos abraçados entre os lençóis, uma acalentando a outra em seus braços, e os olhos voltados para o céu a admirar a Via-Láctea sem fim, leite branco e cereais cristalizados derramados no veludo negro do tapete de Deus.
- Não mamãe, o que quer dizer? – Kátia virou seu rostinho redondo em direção à mãe, para olhá-la no fundo dos olhos. Ela encontrava todas as constelações ali dentro quando não havia céu estrelado lá fora. Os olhos da mãe pareciam ter absorvido o espaço e eram brilhantes como dois sistemas solares em eterna dança. E Maxine também pensava assim sobre a filha, um pequeno anjo de cabelos escuros cacheados, com o rostinho em formato de coração e nariz de morango, sempre vermelhinho e redondinho, sua boquinha era perfeitamente desenhada, idêntica aos lábios do avô.
- Quer dizer revelação, meu bem. – trouxe a criança mais para perto e voltou os olhos para a claraboia do teto de vidro do quarto da pequena Kátia. Um quarto branco e minimalista, mas lindo e repleto de brinquedos e livretos.
- Revelação? – fez a criança, duvidosa. – então porque nós nos chamamos Apocalipse Club? O que nós revelamos?
Maxine riu baixo e beijou a testa da filha demoradamente.
- Nós somos a revelação, minha filha. Nós revelamos quem somos quando chega a hora da verdade, mostramos do que somos capazes, é por isso que somos... O Apocalipse Club.
Aquela fora a última noite antes da mudança fatídica na linha temporal que alterou o futuro...
- Canta pra mim de novo mãe! – pediu a pequenina, trazendo a mãe de volta do seu passeio pela Via-Láctea.
- É claro, meu bem. – sorriu, e passou as mãos pelos cabelos da criança. – I’m going back trhough time at the speed of light...


•••

A nave joaninha pairava sobre o Rio Amazonas fantasmagoricamente, como uma aparição prateada nos céus escuros, seus motores não produziam ruído algum, e seu enorme corpanzil de metal sequer oscilava, não era como um helicóptero que vacilava, que se inclinava à mínima corrente de ar, não, era algo completamente alienígena, estático no ar, congelado no tempo. Lá dentro, na sala de controle, na cabeça da joaninha, pais, filhos e netos vindos do futuro contemplavam a miniatura holográfica de uma fera robótica em cinza, laranja e vermelho, um monstro de metal assustador, tão ou mais assustador que o poderoso Mapinguari.
Aquele era o Arsenal Diabolo Mode, a última versão daqueles robôs simples com a cabine de controle em forma de domo de vidro no lugar da cabeça, equipada com dois receptores de sinal em forma de orelhas, que às vezes lembravam um coelho, outras lembrava um gato. Naquele modelo estes receptores tinham a forma curiosa de pontiagudos chifres diabólicos que juntos produziam faíscas para gerar um choque elétrico avassalador. E isso era o básico que ele podia fazer, aquela máquina de destruição possuía gerador de campo de força, lança-chamas, canhões lasers e mísseis nos braços, no peitoral – onde havia uma enorme chama vermelho-vivo desenhada – e nos ombros. Possuía também gerador de campo gravitacional, lançador de gás venenoso e dedos extensíveis que poderiam virar tentáculos que esticavam a uma distância incrível, servindo até mesmo de chicote. Quando conectado ao cérebro humano, poderia valer-se de telecinese também, possuía também asas extensíveis que lembravam as asas de um morcego, estas ficavam retraídas o tempo todo dentro de um compartimento nas costas do robô, o que em base queria dizer que ele podia voar quando seu operador assim desejasse, impulsionado para cima por dois foguetes embutidos nas pernas. Era a máquina perfeita.
O silêncio após a apresentação da arma secreta foi mortal. Ninguém pronunciava uma palavra. Até que Christopher deu um passo à frente.
- Eu vou pilotá-lo! – disse, estufando o peito.
- Mas nem pensar! – gritou a mãe, logo atrás, puxando-o para perto. – você está louco?!
- E quem disse que eu pedi voluntários para pilotá-lo?! Este robô é meu, EU irei pilotá-lo! – Saturno bateu no peito.
- É, mas este é o nosso mundo e nós queremos salvá-lo! – fez Pietro, dando um passo à frente também, se postando ao lado de Christopher. Os dois se olharam com concordância, os lábios em linhas retas de perseverança e determinação, olhares duros voltaram-se para saturno em seu uniforme amarelo e seus óculos escuros gigantescos que lhe escondiam o rosto.
- Vocês são apenas crianças! Não tem experiência para pilotar um monstro deste tamanho! – foi a vez da mãe de Pietro protestar. – deixa o moço fazer o trabalho dele, meu filho! Não foi vocês quem chamaram ele do futuro pra ajudar?! Agora deixa ele terminar o que veio fazer!
Fez-se mais silêncio. Lá fora, o horizonte estava tingido de vermelho e cinza, os fogos da cidade e a poeira que a guerra levantava havia pintado uma paisagem distorcida e caótica.
- Não somos crianças! – Augusta deu um passo à frente também, postando do lado direito de Christopher – vocês, pais, cobram tanto de nós um comportamento maduro, adulto e responsável, para depois cortarem as nossas asas quando finalmente queremos mostrar do que somos capazes!
- Augusta, volta aqui pra trás agora antes que eu te encha de porrada aqui na frente de todo mundo! – sibilou a mãe de Augusta, sendo segurada à força pelo pai, impedida de ir buscar a garota. – tu não lavas nem as tuas calcinhas direito!
Augusta bufou. Agora foi Ray Ann e Fabíola que tomaram a frente, de mãos dadas.
- Se não vai nos deixar pilotá-lo – começou Ray – pelo menos nos deixe ir com você! Queremos estar juntos na hora da derrota de Alberta e sua gangue! Queremos participar disso também!
Fábia estava sem palavras, muito séria, só afirmou e deu ênfase às palavras da amiga com um leve menear da cabeça, assentindo.
Saturno permaneceu calado, olhando para os cinco de cima. Um burburinho começou entre os pais, “inadmissível!” “nem pensar!” “fora de cogitação!” “absurdo!” “são só crianças!” “ainda nem saíram das fraldas!”. Mas eles permaneceram unidos, sem vacilar, nem sequer olharam para trás. Saturno, contrariado, permanecia muito sério. De braços cruzados, analisava a situação como um imperador romano autoritário, uma estátua de tensão. Foi então que ele deu um passo para o lado em cima da mesa, abrindo a visão dos Apocalípticos e seus pais para o horizonte, para a extensão cor de barro do Rio Amazonas. Mais adiante havia a cidade em chamas que era claramente visível através dos olhos da joaninha, da janela frontal redonda da cabine. Fez-se silêncio outra vez.
Lá embaixo, há 15 andares de distância, no leito do rio, um enorme redemoinho de água se formou, atraindo raios das nuvens carregadas logo acima. Alguma coisa monstruosa rugiu lá embaixo, e era como se a própria besta estivesse se levantando das águas, a sua vinda da outra dimensão para este mundo causou um terremoto que sacudiu a cidade de Macapá de uma ponta à outra. Aos poucos a coisa foi surgindo do fundo do rio, içando-se para fora do redemoinho lentamente, chifres vermelhos antecederam um enorme domo de vidro escuro que reluzia como uma pérola negra gigantesca; e então houve outro rugido apavorante. A água descia de seu corpo enorme em cachoeiras, vazando dos compartimentos inundados. Após o surgimento da sua cabeça, vieram o tronco e os poderosos braços de metal, depois sua pélvis e por fim, as longas pernas. A coisa rugiu de novo, e então percebeu-se que seu rugiu nada mais era do que o som de seus motores esquentando, cada centímetro daquele gigante endiabrado soltava fumaça, era uma caminhonete em fúria, um caminhão monstro de arena uivando, tremendo nervoso. Sua fronte possuía algo de peculiar e ao mesmo tempo espetacular, feito um focinho triangular conectado à nuca por tubos, o qual por sua vez lembrava a máscara negra de Anakin Skywalker ao tornar-se Darth Vader, produzindo o mesmo ruído poderoso de respiração ruidosa que o vilão produzia nos filmes. Mas aquilo era gigantesco, e era a vida real, por mais estranhe que parecesse aos olhos humanos.
Duas luzes vermelhas se acenderam no domo de vidro escuro, eram os olhos da coisa. Os olhos do robô, que esticou seus braços para cima e rugiu outra vez, soltando fumaça das juntas dos joelhos, cotovelos e pescoço, produzindo ruídos pneumáticos e metálicos numa altura ensurdecedora, feito uma chaleira gigantesca reclamando no fogão. De suas mãos de metal, duas labaredas surgiram, e dançaram ao redor da sua cabeça em forma de domo como se tivessem vida própria, atingindo alturas impossíveis, este era o poder do seu lança-chamas. Este era o poder de AR53-N4L, Diabolo Mode.
- E agora, ainda querem pilotar essa coisa?! – fez Saturno, com um sorriso triunfante no rosto. Os jovens estavam de olhos arregalados para aquela besta surgida das águas que os encarava através do vidro frontal da cabine, seus olhos vermelhos acesos fixos em seus rostos apavorados.
Quatro deles voltaram para perto de seus pais, porém Christopher, mesmo morrendo de medo, completamente apavorado, continuou ali parado observando a fera de metal atônito. Ele não sabia nem dirigir ainda! Mal pilotava bicicleta direito! E da última vez que tentou guiar uma moto, quase atravessa uma parede no pátio dos seus tios há poucos meses atrás. Em resumo, o garoto era um desastre de 1,94 de altura.
- Você é insistente, mas não o bastante. – disse Saturno. O focinho triangular do robô abriu-se e uma espécie de língua de metal esticou-se em direção aos olhos da nave-joaninha. O vidro frontal abriu-se para receber esta passarela que parou exatamente aos pés de Saturno Revenge. Este colocou sua capa preta e deu o primeiro passo para embarcar no robô gigante, e foi jogado para o lado repentinamente por Christopher que a atravessou correndo, sem nem olhar para baixo. Correndo todos os riscos do mundo de despencar daquela altura diretamente no rio, quebrando o pescoço com o impacto mortal do seu corpo com a água, ele seguiu sua atitude imprudente e impensada ao som dos gritos de seus pais logo atrás.
- Vamos! – gritou ele para os outros quatro, que também não pensaram muito antes de correr até seu encontro do outro lado da passarela, já na porta de entrada do robô gigante, os pais vinham logo atrás, aos gritos. Saturno estava furioso, gritando e xingado longe, mas era tarde demais, a passarela foi recolhida e os jovens vestibulandos defensores da justiça já haviam sumido no interior do Arsenal...

•••

- Bem vindos, Apocalípticos! – esta foi a saudação que os cinco jovens receberam ao fechar da porta triangular às suas costas. No momento em que tudo escureceu, e o mundo lá fora se ocultou, transformando o dia em escuridão total, eles sabiam que haviam ido em direção a um caminho sem volta. Mais da metade deles estava arrependida de não ter ouvido seus pais, afinal de contas era tudo ou nada a partir de agora. Mais da metade sim, porque somente metade de Christopher Umbrella estava arrependido de ter atravessado à passarela correndo sem pensar, e adentrado no mundo escuro do domo de vidro que era a cabeça do robô gigante.
- Que voz é essa? – miou Fabíola no escuro.
- Deve ser a tal da voz do sistema! – afirmou Pedro, temeroso, com ansiedade na voz.
- Escolham seus capacetes, Apocalípticos. – luzes azuis acenderam-se sobre uma bancada retangular preta onde cinco capacetes coloridos aguardavam lado a lado como crânios futurísticos em exposição numa prateleira de museu. Platinados, cromados e cintilantes, eles reluziam como joias raras perdidas nos templos astecas antigos, atemporais e inexoráveis. Sortidos, cada um deles possuía uma cor única, em verde, azul, amarelo, rosa e dourado. Em todos os capacetes, as viseiras possuíam a cor vermelha tão avivada que chegava a doer nos olhos, mas não pelo lado de dentro, é lógico. Foi automático, como se seus corações já soubessem lá no fundo a cor que lhes era destinada, Augusta colocou o capacete verde, e imediatamente a viseira acendeu uma forte luz vermelha que foi diminuindo de intensidade até tornar-se uma mera aura espectral. Pietro colocou o capacete azul, e o mesmo processo se repetiu nele e em Ray Ann que pôs o capacete amarelo. Fábia, toda animada, pôs o capacete rosa com muito gosto, e por último Chris, que pegou entre seus dedos gelados o capacete cromado dourado, colocando-o.
- O que é isso, manos? Power Ranger agora? – fez a voz de Ray Ann, e era como se ela estivesse dentro da cabeça de cada um deles. As risadas que vieram em seguida também ecoaram dentro de suas mentes como se eles fossem um só. Seus pensamentos estavam conectados. E então veio outra vez a voz da máquina.
- Com estes capacetes vocês estarão em sincronia perfeita com AR53-N4L Modelo Nº666 – disse, e também era como se ela estivesse dentro da cabeça dos Apocalípticos. – Com estes capacetes, suas mentes estão conectadas. E juntos, vocês tem o poder de controlar, basta que vocês queiram. Vocês são o cérebro e o coração da máquina! Boa Sorte, Apocalípticos!
Neste exato momento, entre a fumaça e o fogo da cidade em chamas, o vulto negro do Mapinguari surgiu, como se vomitado pela terra, erguendo-se da névoa cinzenta da destruição, e havia fogo e carcaças metálicas aos seus pés, sendo esmagadas à cada passo dado pelo monstro do caos. As imagens do surgimento do robô rival surgiam na cabeça dos Apocalípticos como sonhos ou pensamentos, sendo transmitidos para suas mentes por impulsos magnéticos poderosos, logo era como se eles próprios fossem parte do Arsenal, enxergando o mundo através dos seus olhos.
- Chegou a hora, pessoal... – Chris estendeu a mão para Fábia, que apertou-a com força e esticou a mão livre para Pietro, este olhou-a nos olhos com compaixão e enlaçou seus dedos nos dela. Do lado esquerdo, Chris ergueu a mão para Augusta, que apanhou-a com firmeza, esta estendendo a outra mão para Ray Ann, que pegou-a sem pestanejar. E então cinco mentes tornaram-se uma só, e eles se viram então vagando num universo totalmente diferente, desprovidos de roupa, era como estar nadando no vazio do espaço sideral, com as estrelas ao redor dançando e abençoando-os. Diante deles a imagem do mundo real se abria num enorme panorama circular, e ao redor de seus corpos, cinturões de informação binária giravam como os asteroides dos anéis de saturno. Eles eram corpos celestes dentro de si mesmos, um único ser, totalmente novo e capaz de proezas inimagináveis.
Quando o Mapinguari pôs o primeiro pé gigantesco dentro do rio, foi atingido em cheio por uma onda de Poder invisível que o lançou para trás, atirando-o por sobre a Fortaleza de São José de Macapá com um estrondo que pôs metade da construção secular abaixo. Os motores do Arsenal rugiram. Aquela onda de energia fora a pulsação da existência da mente unitária dos cinco Apocalípticos.
- Vocês não irão me derrotar! Não dessa vez! – ganiu Alberta, caída de costas no chão da escura sala de controle, seu semblante pálido e magro totalmente diferente do que era há meses atrás. Veias roxas saltavam ao longo da testa suada e das bochechas ossudas, a boca seca descascava dolorosamente, e seus olhos apertados como os de um leitão agora eram duas pedras amareladas de topázio puro, exalando a maldade. O cérebro artificial lhe coroava a cabeça neste momento, sua mente do passado e sua mente vinda do futuro estavam conectadas, unidas, este era o motivo da sua aparência grotesca. O corpo eletrônico da boneca jazia sem vida no chão. Ela levantou-se com dificuldade, e o robô gigante o fez também, e numa velocidade incrível, ele planou sobre o rio sem sequer ser visto, e num segundo estava lá ao lado do Arsenal. Próximo o bastante para jogá-lo para longe com um soco mortal.
Em resposta, antes de cair de costas no rio formando um impacto que gerou um verdadeiro tsunami, o Arsenal obedeceu ao comando de sua mente, de seus mentores unitários.
- MÍSSIL INFERNAL! – disseram as vozes em uníssono. O peito do robô abriu-se lançando seis setas negras pontiagudas e chifradas que atingiram o Mapinguari em cheio, derrubando-o para trás mais uma vez. O efeito daqueles mísseis foi forte o bastante para amassar grande parte da lataria colossal que até o momento era considerada indestrutível, protetora da arma de destruição e morte criada pelas verbas da corrupção brasileira. Mas isso não foi o bastante para pará-lo, ele alçou-se nos céus na velocidade de um foguete, e assim Arsenal o fez, abrindo suas asas de morcego com o comando das vozes unidas ecoando em seu interior, controlando cada movimento, cada passo com sincronia absoluta.
Lá, em alturas impossíveis, muito acima das nuvens, entre os satélites e o lixo espacial, já saindo da órbita do planeta terra, os dois monstros de metal trocaram chutes, socos, tiros, empurrões e lasers poderosos que foram lançados ao tomarem certa distância um do outro. O Arsenal investiu então contra o Mapinguari com uma força tremenda, seus chifres vermelhos poderosos furaram sua lataria em três níveis, abrindo feridas profundas no titânio. Os dedos extensíveis entraram em ação, e enlaçaram o enorme corpanzil do macaco de metal, envolvendo-o num abraço mortal e impulsionando-o para trás numa velocidade tremenda. Logo as duas máquinas gigantes estavam abraçadas dando a volta na esfera terrestre muito mais rápido do que qualquer aeronave do século XXI poderia fazer, mas a força do Mapinguari era tanta, e a perseverança de Alberta Veronese em seu controle era tão forte, que ele foi capaz de arrebentar os dedos extensíveis, empurrar o Arsenal para longe e em seguida enchê-lo de socos, seguido de um chute mortal que lançou-o para longe do planeta terra, arrebentando os satélites que pairavam na órbita ao redor.
- DROGA! – xingou alguém, em algum lugar do mundo. – A TV SAIU DO AR BEM NA HORA DA NOVELA!
A batalha continuou já há alguns quilômetros de distância do planeta, no meio do sistema solar, no espaço sideral, mísseis e lasers cruzavam o vazio e atingiam seu alvo em cheio. Em poucos segundos, aqueles dois seriam carcaça! Já estavam parcialmente destruídos àquela altura. Em medida de desespero, o robô de Alberta Veronese lançou-se contra o robô dos Apocalípticos, movendo-o em direção à terra, na esperança de que a queda na atmosfera terrestre o derretesse, mas nem isso foi o bastante. Quando ela tentava escapar saindo à francesa, os dedos extensíveis agarraram-lhe o calcanhar de metal, e assim o Mapinguari foi puxado para baixo, e os dois se engalfinharam numa luta de cão e gato ferrenha, eram bolas de fogo trocando socos e chutes agora enquanto desciam à toda velocidade em direção ao oceano Atlântico.
A massa de ferro formada pelas duas bestas de metal engalfinhadas que desceu do espaço numa velocidade absurda atravessou a superfície oceânica gerando tsunamis que atingiram, já fracas – pois os dois não eram grande o bastante – as costas da África e da América do Sul, e a luta prosseguiu no fundo do mar, no solo oceânico, entre os cetáceos e as montanhas submersas, dentro das fossas abissais e da divisória das placas continentais.
- TIVE UMA IDEIA! – bradaram as vozes unidas, e seus corpos físicos agarraram o vazio. Lá fora, o Arsenal agarrou Mapinguari pela cintura, deu a volta em forma de U e desceu o abismo escuro da divisa entre as Américas e o continente Africano. Aos poucos uma luz amarela misteriosa foi surgindo e se intensificando, até que finalmente sua origem foi revelada: um rio de lava corria há milhões de quilômetros de profundidade, e o plano dos Apocalípticos era afundar o Mapinguari ali, de onde não haveria volta para ele nem para suas três operadoras maléficas.
- NÃO, NÃO HOJE, CHRISTOPHER UMBRELLA! NÃO HOJE! – gargalhou Alberta no escuro, socando o vazio, e seu soco refletiu-se no mundo exterior, o braço potente do Mapinguari acertou a cabeça do Arsenal e água começou a invadir todo o compartimento da cabine de controle nível após nível, logo os Apocalípticos estariam em grave perigo!
- Abortar Missão. Abortar Missão. Abortar Missão. – repetia a voz robótica do sistema enquanto boias amarelas inflavam-se nas extremidades do corpanzil do Arsenal, ele estava sendo içado para fora do oceano, para a superfície. Lá em cima eles estariam fora de perigo. Porém, antes que os Apocalípticos se vissem livre das profundezas abissais, foi a vez do Mapinguari agarrá-lo e devolvê-lo para o fundo.
- CHOQUE ELÉTRICO! – gritaram as vozes apocalípticas, e os chifres do Arsenal Diabolo Mode produziram uma descarga elétrica que paralisou cada centímetro do Mapinguari, desligando seu sistema interno. Alberta rugiu de raiva enquanto seu robô gigante descia de encontro ao rio de lava. A esta altura, o Arsenal já alcançava a superfície e rumava para o extremo norte da América do Sul, voando a toda velocidade.
- CONSEGUIMOS! CONSEGUIMOS! CONSEGUIMOS! – a mente apocalíptica comemorava em cinco vozes sincronizadas, que vibravam de felicidade em seu interior. Apenas uma única voz mantinha-se calada, aquela voz que soava como sinos de uma igrejinha do interior, que lembrava verões ensolarados e que lembrava o cheiro das margaridas, o gosto da baunilha. Aquela vozinha doce e infantil de Lolita que Fábia possuía estava quieta em meio à comemoração, e séria como nunca antes.
- O que houve Fábia? – perguntou Chris, olhando para o lado, para o vulto rosa que pairava no vazio do espaço ao seu redor. Ao lado dela havia um vulto azul, e do lado esquerdo de Chris, vultos verde e amarelo. Da cor do Brasil. Augusta e Ray Ann.
- Eu estou com um pressentimento ruim... – disse, finalmente.
- Mas nós a derrotamos, Fábia, nós derrotamos aquelas três! Elas estão no fundo do oceano para sempre! – era a voz de Pietro que ecoava agora nas mentes conectadas.
Fez-se silêncio, a única coisa que atingia os seus ouvidos naquele momento era o som do vento cortando a estrutura de metal já comprometida do corpo do Arsenal. Lhe faltavam dedos, seu “crânio” estava rachado, sua lataria arranhada e furada profundamente em pontos diferentes.
- Isso ainda não acabou, eu sei que ainda não acabou. – fez ela, cortando o silêncio. E não deu outra. Algo os atingiu em cheio quando eles já enxergavam a costa amapaense e sua floresta tropical logo à frente, e as águas azuis profundas do oceano Atlântico estavam se tornando amareladas e barrentas, e pedaços de terra cobertos de verde iam despontando no horizonte ensolarado da tarde. Era Alberta Veronese, voando logo atrás, há poucos centímetros deles, esticando o braço mecânico já muito danificado do Mapinguari em direção à eles.
- COMO EU DISSE, - fez Alberta – NÃO HOJE, CHRISTOPHER UMBRELLA, NÃO HOJE, APOCALÍPTICOS! – e gargalhou ainda mais alto. Suas comparsas Velma e Úrsula assistindo tudo de camarote em suas cabines ovais. Úrsula demonstrava uma diversão fria e cruel vendo aquilo, seus olhinhos de porca estavam apertados e confiantes da vitória, seu sorriso debochado rasgado no meio da cara gorda cheia de espinhas mostrava os dentes separados num sorriso triunfante enquanto sua franjinha mal talhada lhe caía sobre os cílios. Era a imagem perfeita do asco e da crueldade. Enquanto isso, na cabine ao lado, Velma chorava no escuro observando aos horrores de braços atados. Por quê? Porque ela havia deixado isso chegar tão longe? Porque ela envolveu Alberta e Úrsula naquilo? Jamais imaginaria que seu plano fosse voltar contra si mesma, e que as suas duas melhores amigas fossem se tornar aquelas duas criadoras sedentas de poder. Porque não sentou e conversou com os meninos? Agora estava tudo perdido!
- DIGAM ADEUS, APOCALÍPTICOS! – rugiu Alberta. Macapá estava há poucos quilômetros agora. – RAIO FINAL! – e desceu o indicador sobre o botão vermelho no painel diante de si. A luz branca brotou dos olhos do Mapinguari, e envolveu o Arsenal em milésimos de segundos, fazendo-o se despedaçar sobre o rio aos poucos, explodindo cada centímetro de seu corpo vulnerável pela luta no espaço e no fundo do mar. Pedaços de metal em chamas choveram como estrelas cadentes sobre Macapá e sobre as ilhas do arquipélago marajoara tamanha foi à explosão e a altitude onde ela ocorreu. Na nave joaninha, famílias inteiras choravam, mães entravam em colapso nervoso, pais esmurravam as paredes, desconhecidos se abraçavam. Estaria tudo perdido então?
Christopher não sabia onde estava agora, sentia a distância física entre ele e seus amigos, mas suas mentes ainda estavam conectadas, porque eles ainda usavam os capacetes. Ao que parecia então, eles funcionavam independentemente da central estar destruída. Ao seu redor, o vazio estrelado e os códigos binários ainda dançavam, e ao seu lado, Ray, Guta, Fábia e Pietro continuavam parados, se entreolhando, tentando entender o que havia acontecido. Se o Arsenal havia sido destruído, então porque eles ainda estavam ali, naquele micro universo em espírito, um ao lado do outro? Seria porque eles ainda estavam de mãos dadas no mundo real? E a distância física que Chris sentia era mera impressão?
- Talvez a cabine tenha caído intacta – foi Ray quem cortou o silêncio.
- Ela tem razão. – fez Pietro. – vai ver a cabine do Arsenal é como a caixa preta de um avião!
- Mas quem vai nos encontrar então?! – exclamou Augusta – quem vai encontrar nossos corpos?! Podemos estar perdidos em algum lugar no fundo do rio, e talvez levem anos para nos encontrarem, ou talvez nem nos encontrem, já que Alberta nos venceu!
- Ela não nos venceu, Augusta! – contrariou Chris. – não fale besteira!
- Nós fomos pelos ares! – gritou Augusta em resposta. E a gritaria começou.
- SILÊNCIO! – urrou Fábia. A discussão cessou. – estamos vivos, isto é fato, ou não estaríamos aqui juntos. E pelo visto ainda estamos de mãos dadas, ou não estaríamos nos vendo...
- Mas como vamos sair dessa?!
Lá fora, no mundo real, o espectro do Mapinguari, já em pandarecos, quase carcaça, pairava sobre o local da explosão do Arsenal, vendo os restos do robô gigante boiando nas águas barrentas do Amazonas há poucos quilômetros da frente da cidade de Macapá. Em seu campo de visão, a nave joaninha não estava tão distante, e o serviço só estaria feito quando ela acabasse de uma vez por todas com tudo o que havia de Apocalíptico no mundo, tudo mesmo. E isso contava como as famílias dos mortos na explosão. Assim ninguém mais se oporia a ela e nem aos seus planos, e não haveria mais nada no seu caminho para a vitória, e dirigindo-se para lá, Alberta deparou-se com algo assustador.
Em plena uma da tarde, o céu escureceu. Instantaneamente, como um piscar de olhos. Ficou mais escuro que a noite, um breu. E então um pavor sem tamanho tomou conta de seu ser, contaminou seu coração obscuro e maligno, um pavor tão grande que fez suas pernas bambearem de medo. Luzes estranhas nunca antes vistas cortaram o escuro acima do rio, da cidade, do mundo, de norte à sul, serpenteando como as correntes de ar, mudando de verde para azul, de azul para vermelho, de vermelho para rosa, um arco-íris disforme e informe brincava no céu, iluminando aos poucos a escuridão pavorosa que havia caído sobre aquela região. Era a aurora boreal. Sim, era a aurora boreal, mas ela estava longe demais do Polo Norte para estar vendo tal tipo de coisa. Ela estava exatamente sobre a linha do Equador! Isso era absolutamente impossível nas leis da física ou da lógica, era fora de cogitação na natureza!
Para seu maior desespero, mais faixas de luz colorida foram surgindo no céu, uma ao lado da outra, como serpentes, rios divinos correndo de cabeça para baixo. E em instantes tudo era luz e cor, num espetáculo nunca antes visto, as luzes dançavam em sincronia como ondulações da barra de uma cortina açoitada por uma leve brisa, a cortina que selava os mundos, a cortina das janelas de Deus.
Eis que dois aviões Caças cruzam o espaço acima do Mapinguari, deixando um rastro de fumaça para trás, dando um rasante sobre a cabeça do robô gigante antes de desaparecerem nas nuvens coloridas de luz. E então o medo de Alberta aumentou ainda mais quando ela se deu conta do que a fumaça deixada para trás por aquelas duas aeronaves formavam no céu acima dela: era o triângulo, o triângulo de três braços dentro do círculo perfeito, o símbolo do Apocalipse Club com as luzes da aurora boreal sobrenatural como plano de fundo. O coração de Alberta disparou, algo lhe dizia que seu fim estava próximo, e dessa vez era definitivamente.
De dentro das luzes, elas foram surgindo, aeronaves de todos os tamanhos, robôs pequenos como formigas e outros tão grandes quanto o próprio Mapinguari, alguns até maiores! Eles andavam sobre a aurora boreal como se ela fosse uma passarela física que se inclinava formando uma ponte para este mundo, uma ponte que caía exatamente sobre a cidade e também sobre o rio, uma passarela, uma avenida para uma parada tecnológica de robôs de todos os tamanhos e formas. Animais e insetos, monstros, anjos e demônios de metal pilotados por senhores misteriosos, humanoides ou não, eles vinham numa grande manada de pernas e braços mecânicos, rugindo, gemendo, faiscando, assobiando, rangendo, esmagando.
E Alberta então viu-se cercada por eles, por milhares deles, pequenos e grandes, com seus canhões todos apontados para o seu Mapinguari. E de repente já não havia mais Mapinguari. E talvez já não houvesse Alberta também.
- Vocês estão sentindo isso?! – perguntou Christopher. – estou ouvindo vozes!
- Eu também estou! – exclamou Fábia. Ela foi o primeiro vulto a sumir.
- O que está havendo?! – após questionar, Ray também sumiu. E em seguida Augusta e depois Pietro. Chris foi o último a deixar o micro universo para trás, e a sua forma espiritual dourada também. Alguém havia lhe tirado o capacete.

•••

And there's no brakes
There's no heart breaks
Love over takes
No brakes
There's no heart breaks
Love over takes


No Brakes – Little Boots






Continua...

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