Bem vindos à minha fábrica de sonhos!

quarta-feira, 14 de julho de 2010

The Big Machine II - Parte 8



- Já tentou a casa da Gabrielle?
- Já! Eu já liguei para todos os amigos dessa menina, ela não está em lugar nenhum! Em lugar nenhum! – Stéphanie nunca esteve tão desesperada em toda a sua vida – e o pior é que Fernando e Gabrielle também sumiram! Eu liguei para as duas casas e eles não voltaram da escola! Me parece que o Miguel voltou, mas sozinho!
- Essa menina se meteu em encrenca, eu tenho certeza de que ela se meteu em encrenca – já passava da meia noite e o casal continuava do lado do telefone, em guarda, esperando tocar, qualquer notícia era válida. O velho Umbrella só conseguia olhar pela janela, para o enorme prédio em forma de seta que ficava há algumas quadras dali, na Warhol’s Square. – papai, porque você não liga pra tia Augusta ou pro tio Pietro?! Os meninos gostam muito deles dois!
- Não tem telefone lá no Apocalipse Hall – disse o velho, frio – é fora de cogitação que eles tenham ido para o sítio, é fora de Neon City, menores de idade só saem da cidade à noite na companhia dos pais.
- Vou ligar pra mamãe! – Stéphanie pegou o telefone.
- Larga esse telefone, Steph! Deixe a linha livre caso a Max resolva ligar! – Dominick tomou o telefone das mãos da mulher.
- Olha pro relógio! É uma da manhã! Tem certeza de que ela vai ligar?!
O velho subiu, catou seu DiscoStick, meteu-se numa capa preta, calçou suas botas, desceu da sua torre prateada e abriu a porta da frente.
- Eu não sei vocês, mas eu vou até o prédio da Alberta...
- Mas fazer o que, papai?! Você está maluco? Está fechado a essa hora!
- Não se esqueça, Dominick, que hoje é sexta feira, e a “Fazendinha da Tia Alberta” costuma fazer o corujão a partir das uma e meia... – ele botou o pé pra fora da casa, meteu as mãos no vaso de uma samambaia e puxou um controle remoto preto de um único botão.
- O que você está fazendo, papai?! – Dominick correu afoito para o pátio de pedra.
- Eu nunca pensei que fosse precisar disso algum dia... – o pátio abriu-se repentinamente. Stéphanie gritou de susto, quase caíra no buraco que havia se formado no lugar da fonte central do jardim. Uma plataforma substituiu a fonte rapidamente por uma estranha moto anti-gravitacional prateada salpicada de luzes azuis que ladeavam sua estrutura lisa e aerodinâmica.
- Papai! Mas o que é isso?! Como você escondeu isso aí todo esse tempo?!
- Ah, menino, relaxa! – fez o velho Umbrella, todo cheio de trejeitos e floreios. – no tempo que você tava em Marte, eu fiz uns ajustes nessa casa, já que essa daqui só vivia socada na firma – apontou com o cajado brilhante para Stéphanie, que ainda estava muito chocada pra falar alguma coisa.
- E as crianças sabem disso!? – Dominick dava voltas e mais voltas ao redor da moto. Era incrível. Não tinha rodas, flutuava produzindo uma auréola de calor.
- Claro que sabem, elas sabem de tudo, meu filho – com uma gargalhada, ele subiu na moto e saiu em disparada, cortando os ares feito um foguete, planou junto aos carros aéreos sobre a cidade mais brilhante de todo o planeta, rodopiou por entre as alegorias dos prédios, deu piruetas ao redor dos outdoors e dos telões e foi pousar exatamente sobre o tão famoso prédio da empresa maligna de Alberta Veronese.
- Aqui eu já cheguei... O grande problema agora vai ser entrar nessa fortaleza... – Christopher retirou do bolso um aparelho retangular prateado muito semelhante a um tenori-on, instrumento muito usado na música neo-eletrônica dos nossos tempos. Mas isto que o velho Umbrella tinha em mãos não era um aparelho que produzia sons, era na verdade um rastreador cujo alvo, o chip que atraía o seu sinal, era o Pen Drive triangular de Maxine. – Eureka! No térreo! – e iniciou sua caçada pelo respiradouro do prédio. Conseguiria ele chegar a tempo?

- Se eu dissesse a vocês que estão completamente perdidos, seria muito pouco perto da situação real de vocês... – ele deu uma mastigada no tabaco e ajeitou o cinto das suas calças apertadas de vaqueiro. – esse botão bem aqui vai mandar vocês direto pra esse incinerador, onde vocês serão assados, após este estágio, alguns de vocês continuarão vivos, o que é uma lástima, mas o fato é que serão fatiados e embalados como alimento pré-requentado... – ele respirou fundo, havia dito tudo num fôlego só. – ele dançou os dedos sobre a pequena mesa de controle do robô-incinerador. Seus braços estavam parados, tesos como estátuas de ferro. Os grandes olhos de vidro fixos nos três acorrentados e amordaçados de cabeça pra baixo, seu focinho de touro já soltava fumaça. O galpão estava vazio naquela noite, todos os corpos haviam torrado lá dentro a esta altura. As lágrimas dos jovens caíam de cabeça para baixo, encharcando suas testas nervosas e seus cabelos. Gabrielle era a que mais se retorcia, Fernando parecia entorpecido.
Um aparelho de telefone celular tocou. Robert meteu as mãos no bolso e atendeu.
- O que?! – ele tomou a informação recebida de sobressalto – como assim?! Ela está vindo pra cá agora?! Ela não ia ficar por lá durante uma semana?! Droga! Droga! Estou indo, estou indo!
Ele voltou-se pros dois cientistas que os observavam sérios.
- Estão me chamando no último andar, a chefa está voltando de viagem com novidades! – ele apontou os dois dedos indicadores na cara dos dois. – não vacilem. Fiquem de olho. – e levou o dedo à pálpebra inferior, puxando-a para baixo, e em seguida saiu pela porta dupla quase à galope.
Os dois cientistas se entreolharam.
- Eu não acho certo que... – começou a mulher. Foi logo interrompida.
- Não me venha com seu sentimentalismo! Ou são eles ou nós vamos virar carne!
- Eles são apenas jovens, Paulo! São crianças! Tem uma vida inteira pela frente!
- E eu também! – ele virou de costas para cena, não queria olhar para aqueles seres humanos prestes a ter a mais terrível morte que se pode imaginar: ir parar na barriga do seu próprio vizinho.
- Não seja egoísta, Paulo! Vamos soltá-los! Vamos dizer que alguém veio aqui, nos rendeu e os libertou, sei lá! Eu invento qualquer coisa!
- Suas invenções vão nos levar pra forca! Estas ordens vêm da ESFERA!
- E se eu disser pra você que tudo isso aqui é ilegal?! E se eu disser que não acredito em nenhuma palavra do que essa gente diz!? Eles são os vilões aqui, Paulo! A ESFERA preza pela vida humana, ela não deixaria que isso acontecesse! Isso tudo aqui é ilegal, completamente ilegal!
Paulo vacilou.
- Você acha, realmente?!
- Vamos! Me ajude!
O varal em que os três estavam pendurados iniciou sua descida após o simples toque numa tela touch-screen. Enquanto isso, o velho Umbrella e suas complicações na coluna rastejavam pelos túneis do respiradouro do prédio:
- Ai, droga! Droga! Eu não sou nenhum jovem de 17 anos agora! O que eu tinha de fazer pra cá?! Porque eu simplesmente não usei a saída de incêndio do prédio?! Porcaria! – ele já se arrastava com dificuldade quando uma das telas de saída de ar quebrou com todo o seu peso, fazendo-o vir abaixo com tudo, bem no meio de um salão repleto de balcões onde compostos químicos e experiências em pausa descansavam tenebrosos. Clones, robôs gigantes, mesas cheias de frascos e livros, de tudo um pouco ali havia naquela galeria de horrores. Verdadeiros monstros, alienígenas abertos para análise, corpos e cadáveres humanos em estado de bálsamo para estudos, tanques de nitrogênio, de hélio, de elementos químicos desconhecidos, de metais estranhos trazidos do espaço, de elementos radioativos contidos por vácuo. O grande galpão do último andar, o galpão que antecedia a sala de controle central de Alberta Veronese.
Vozes começaram a ser ouvidas assim que o elevador apitou. Christopher rastejou para debaixo de uma mesa. Tudo ali estava à meia luz, o que facilitou a sua camuflagem.
- Como assim ela está vindo?! Essa velha é maluca por um acaso?! – eram gritos agora, gritos revoltados de um homem muito afoito – ela causa um acidente semi-nuclear nas ruínas e foge, assim, como se não fosse pouca coisa?!
- Ela já está na lista de procurados da ESFERA, e já nos foi dada a ordem de acionar o sistema assim que ela aparecer por aqui... Temos de fazer isso mesmo, Senhor Robert?
- Não Margarida! Não façam!
- Mas aí seremos cúmplices!
- Só faça o que eu mandar, Margarida! Só o que eu mandar!
- Mas a ESFERA...
- Que se dane a ESFERA! Esse computador idiota será passado quando a velha Alberta por os pés na cidade! Em menos de três horas ela estará aqui!
Christopher ouvia tudo com muita atenção. Os três vultos cruzavam o galpão a passos largos em direção à porta circular da sala de controle, esperariam pela sua chefa ali, embaixo da lâmpada que iluminava aquela entrada, feito três sentinelas sombrias e malignas, estátuas assustadoras. O velho escondido embaixo de um dos balcões não podia nem respirar, um movimento em falso e detectariam a sua presença naquele lugar. Ele já havia ouvido o bastante para concluir que Alberta Veronese estava armando contra a ESFERA e fora descoberta bem a tempo pelo sistema, como conclusão, estava sendo caçada como criminosa nos quatro cantos do globo àquela altura. Quem diria. Tantos anos se passando por boa moça, servindo de bom exemplo, de estudiosa, inteligente e comportada, aquela mesma Alberta Veronese que sentava do outro lado da sala de aula com os populares acabaria como criminosa. Mas, como diriam os pais de Christopher “um dia a casa cai”, e realmente caiu para aquela velha senhora que passou tantos anos escondida atrás de uma máscara, sendo a criatura mais sonsa que ele já vira até hoje. É um velho clichê, mas é a realidade mais universal de todas: a justiça tarda, mas não falha. Porém, quem disse que Alberta desistiria?
- Minha senhora! Minha senhora! – exclamou Robert ao ver a porta do elevador se abrir do outro lado do galpão. As luzes foram acendendo uma a uma enquanto os saltos das pequenas botas da mulher estalavam feito tiros dados para o chão, fatais como a sua dona. A eletricidade estática ainda percorria todo o corpo potente da sua armadura de cowgirl biônica, de cima à baixo, soltando faíscas pelos esporões
- Cale a boca Robert! – um raio azul saiu da sua mão esquerda e atingiu em cheio vários frascos que descansavam em cima de um balcão. As chamas subiram rapidamente. “Alerta de fogo. Alerta de fogo” soou o alarme de incêndio – eles estão chegando já! A ESFERA já acionou o exército, em 15 minutos eles estarão cercando o prédio! Prepare o meu carro.
Robert ainda estava estático. Surpreendido pela nova aparência de sua ama, estava sem palavras.
- O QUE ESTÁ ESPERANDO?! VÁ! – gritou – AGORA!!!
Robert saiu correndo. Os dois cientistas foram logo atrás. Alberta ficou sozinha, era hora de atacar.
Christopher rastejou alguns metros, pôs-se de pé, catou uma corda que surgiu por ali em boa hora e avançou para cima da mulher, surpreendendo-a por trás e pegando-a pelo pescoço, a velha grasnou. Seu primeiro reflexo foi levar as mãos às costas, agarrando em cheio as orelhas do velho. A saída foi jogar-se de costas sobre seu agressor, como muitas vezes fizera nos ringues de luta livre, esmagando-o com todo o seu peso e o peso da sua armadura de titânio. O velho Umbrella deslocou o ombro e soltou um grito, largando a corda imediatamente para levar a mão boa ao ombro machucado, foi então que o jogo virou. Alberta Veronese o prendeu com suas fortes pernas e sentou-se em cima dele.
- Ora, vejam só! Christopher Umbrella! Há quanto tempo, há quanto tempo! – ela puxou um cigarro do bolso e acendeu com o dedo. – Não vou perguntar a você como chegou aqui, suspeito que tenha descido pelos respiradouros do terraço... Mas agora isso pouco importa! – e desferiu-lhe um soco fatal de ferro, quebrando o nariz. – isso é por você e aquele seu Apocalipse Club passarem metade do ensino médio rindo da minha cara pelas costas!
Christopher gargalhou.
- Então você sabia?! – gargalhou de novo.
- Eu sou sonsa, mas não sou tonta, Umbrella – virou-o de peito para o chão e amarrou suas pernas e suas mãos com a mesma corda que ele usara para tentar sufocá-la há alguns segundos atrás. – vê como o jogo vira?
- Vejo! Cuidado, muito cuidado para ele não virar contra você, que está tão acostumada a controlar tudo e todos à sua volta! – ele ria, mas seu ombro deslocado combinado ao nariz quebrado doía feito o inferno, para ele que nunca havia quebrado um osso sequer em todos aqueles 64 anos. Para sua surpresa, a velha colega de escola Alberta Veronese deu-lhe um chute com o bico da bota bem no meio do estômago ao se levantar. Christopher uivou de dor. Sua dentadura caiu. Neste exato momento, Robert entrara no galpão, bestificando-se com a cena que encontrara após apenas cinco minutos de ausência.
- Feche essa boca que se não entra mosca! Temos apenas cinco minutos para dar no pé, as tropas estão fechando o quarteirão!
E então o alarme soou, fazendo do branco das paredes um vermelho vibrante e do silêncio mortal um lamentar infernal de sirenes.
- Creio que vocês não tem mais todo esse tempo! – riu Christopher. Alberta o olhou com a mesma cara de nojo que olhava para todo mundo, caminhou até Robert, o pegou pelo braço e saiu arrastando-o. – aurrevoi, monsieur Umbrella! – debochou.
Mal se passaram 15 minutos, e para o alívio do velho que já chorava rios de lágrimas de tanta dor, Maxine, Gabrielle e Fernando entraram no grande galpão por uma escada de emergência acompanhados de dois cientistas. Ele gritou por eles, com o último fôlego que tinha.
- Eu não disse! Eu disse que eles tinham um prisioneiro aqui em cima! Eu ouvi aqueles dois falando sobre um velho quando estavam descendo para a garagem! – vibrou a mulher.
- Vovô! Vovô! – Maxine desabou em choro imediatamente, abraçando o velho com cuidado e acariciando o seu rosto ensangüentado, completamente desfigurado pelo punho de ferro de Alberta Veronese. O velho uivava feito um lobo ferido. – calma vovô! Calma! Nós vamos sair daqui! Vamos sair daqui sim! Você vai ficar bem!
- Minha filha! Minha filhinha! Por favor! Saia daqui, leve Gabrielle e Fernando com você! Agora!
- Não! Eu não saio daqui sem o senhor! – chorava a garota, acariciando e beijando os cabelos grisalhos do avô.
- FAÇA O QUE EU ESTOU DIZENDO! – gritou ele – vão para o Apocalipse Hall e peçam ajuda para o Pietro! Ele sabe onde está a Manopla!
- Do que você está falando? Do que você está falando?! – Maxine estava confusa. Podia ouvir os robôs subindo as escadas, o prédio já tremia.
- Eles não sabem do plano da Alberta! Eles não sabem que ela quer sobrepor-se ao sistema! Alguém tem de pará-la!
- E porque eu?! – perguntou Maxine, chorosa.
- Porque você é Maxine Fernandes!
A parede Oeste explodiu, lançando concreto e poeira para todos os lados, revelando a impressionante paisagem de Neon City, uma verdadeira flor resplandecente e colorida brotando no meio da escuridão do deserto. Repentimente, a moto psicodélica do velho Umbrella apelidada de Planária entrou voando pelo buraco na parede. Era grande o bastante para confortar três pessoas.
- Subam nela! Subam! Ela vai levá-los até o sítio!
- O sítio do meu avô?! Nas ruínas de Macapá?!
- VÃO!
Os robôs prateados de braços e pernas finas começaram a lotar o galpão. Os três já voavam por sobre a cidade, desviando de prédios e rodopiando no ar como se montassem uma libélula que brincava por entre os tubos das alegorias de neon que permeavam as construções da cidade. Desviando dos carros voadores e das ligas de braços metálicos que interligavam os monstros de concreto, sumindo por entre as estrelas, atravessando os céus gelados do deserto em direção às tenebrosas ruínas da velha cidade abandonada de Macapá.

Fim da parte oito!
-Q

Nenhum comentário:

Postar um comentário

E então? O que achou?