Bem vindos à minha fábrica de sonhos!

segunda-feira, 5 de julho de 2010

The Big Machine II - Parte 3


Calculando Informações...
Checando database...
Checando dados recebidos...
Inicializando Protocolo...
Dados Comprovadamente Seguros.
Arquivando na central ESFERA...
Arquivado.
- NÃO! ISSO É FLOODING! ISSO É INFORMAÇÃO FALSA!
Olhos abertos, olhos castanhos enormes abertos, constatando a sua localização atual, sentindo o despertar para a realidade. E a realidade é: um quarto comum, sem muitos luxos, mas muitos livros, muitos pôsteres e muitos bichos de pelúcia. Uma cama, um guarda-roupa e infinitas prateleiras.
- Acorde Senhorita Maxine! Já é dia Senhorita Maxine! Seu horário deve ser cumprido Senhorita Maxine! Está atrasada Senhorita Maxine!
- Eu já entendi, Edwiges! Agora pare de ficar repetindo Senhorita Maxine se não eu vou acabar te reprogramando! – Maxine atirou uma almofada na coruja de metal com olhos verdes que batia suas asas em cima do guarda-roupa. Uma coruja-robô, biônica, inteligência artificial básica e antiquada.
- Não faça isso comigo, Senhorita Maxine! Eu executo o mesmo sistema operacional desde 2020 Senhorita Maxine, seu pai lhe mataria Senhorita Maxine! – a coruja-robô desceu do guarda-roupa batendo suas asas metálicas e dando voltas completas em seu pescoço de metal, produzindo ruídos de ferrugem e maquinaria.
- Você está muito antiquada, Edwiges. Acho que está na hora do papai te trocar... – Maxine abriu o guarda-roupa, e aquilo que parecia ser um simples armário de madeira revelou ser na verdade a porta de entrada para um mundo que a garota chamava de closet. As gavetas de baixo abriram-se formando degraus, pelos quais Maxine subiu.
- Ele não o fará, Senhorita Maxine, eu sou relíquia de família, Senhorita Maxine! – a coruja foi logo atrás, com todos os seus ruídos e seus estalos pneumáticos de tecnologia ultrapassada. Maxine parou e virou-se.
- Edwiges, por favor, eu te peço – a garota juntou as mãos – vá procurar o que fazer! – gritou.
- Só executo uma tarefa se ela me for ordenada, Senhorita Maxine, especifique o que você quer que eu faça, Senhorita Maxine!
- Tudo bem! Tudo bem! – Maxine levantou as mãos pro alto em sinal de redenção – eu quero que você vá perturbar o Gustavo!
- Com todo o prazer, Senhorita Maxine! – Edwiges voou pra longe, saindo pela porta entreaberta, cantando algo como “senhor Gustavo, senhor Gustavo! Eu vim lhe perturbar, Senhor Gustavo”. Alguns segundos depois, Maxine ouviu os gritos do irmão aos fundos do canto da coruja, correu até a porta do quartinho e trancou-a antes que o garoto viesse socá-la como costumava fazer, e voltou para o seu mundo infinito de roupas, sapatos e acessórios, escondidos por um humilde guarda-roupa de madeira. Com o controle remoto nas mãos, Maxine apertou no mínimo uns seis botões, e eis o que aconteceu:
Um figurino vermelho completo com macacão vermelho de vinil, óculos Rayban SkyDrive, lançados recentemente com um design incrivelmente aerodinâmico e botas pretas. Maxine esticou os braços na direção das roupas e então as cores das suas unhas mudaram automaticamente de prata para vermelho ao reconhecerem o figurino de mesma coloração que estava diante delas. As mulheres da década de 50 do século XXI não se preocupam mais com fazer as unhas, elas são substituídas cirurgicamente por placas holográficas que mudam de cor conforme o figurino escolhido.
- Isso sempre é o máximo. Nunca vou me acostumar com a ideia – Maxine suspirou, vestiu suas roupas, catou uma bota preta qualquer jogada debaixo da cama e saiu para o café. A família inteira estava reunida lá embaixo, numa mesa redonda: os pais de Maxine, Dominick e Stéphanie, os dois irmãos de Maxine, Gustavo e Alexandre e o vovô Umbrella, que estava sempre olhando para o vazio com cara de sono e fazendo anotações aqui e acolá. A coruja Edwiges ainda perturbava Gustavo.
- Maxine, eu vou te matar! – ameaçou o garoto.
- Nem vem com essa pro meu lado, a coruja é sua, arque com as conseqüências. E se eu encontrar ela no meu quarto de novo eu vou reprogramá-la!
- Sabe que se fizer isso o papai te mata! – disse o pequeno Alexandre, comendo um biscoito.
- É, sabe que o papai te mata! – imitou Dominick apertando a bochecha da criança mais nova.
- Bom dia vovô! – Maxine pulou no velho e deu um abraço apertado daqueles, como ela costumava fazer toda manhã. O vovô Umbrella sorriu. 64 anos de idade, tinha uma fortuna em seu nome, e uma mansão em algum lugar, mas pouco gastava agora, já fora muito famoso, e nos dias atuais apenas recebe os louros da vitória.
- Bom dia minha filha! – o velho retribuiu o abraço – e aí? Como vão as coisas na Octopus?
- Renovaram meu contrato para mais dois anos, acredita?! – Maxine vibrou.
- Nossa! Mas isso é incrível meu anjo! É incrível! – ele abraçou-a de novo – nós precisamos fazer outro remix como aquele então! Se eu soubesse que isso ia te ajudar tanto assim, teria feito melhor para que você fosse contratada por mais cinco ou dez anos!
Maxine deu um beijo estalado na bochecha do velho.
- Não seja bobo, vovô! O que você fez por mim já está de bom tamanho! Agora basta que eu mantenha o contrato e a qualidade do eletrônico experimental.
- Vamos lá pra cima quando você voltar da escola para dar uma olhada nos meus CDs, meu bem! Tenho uma música que vai ficar ótima nos seus remixes... – os olhos cansados do velho Christopher Umbrella bateram sobre o pingente triangular no pescoço de sua neta, e de animados e eufóricos seus olhos passaram para um meigo saudosismo em satisfação. Ele pegou a joia tecnológica entre seus dedos enrugados com delicadeza e beijou-a.
- Cuida bem disso, minha filha, cuida muito bem. Isso ainda vai te ajudar muito! – ele ergueu as sobrancelhas e o dedo indicador.
- Acha que já não está ajudando?! Toda a minha vida está aqui!
- A vida de todos nós está – vovô Umbrella fechou os olhos e voltou-se para o livro velho que lia. Sempre gostou de livros antigos, desde que era muito jovem. Maxine deu-lhe outro beijo.
- Vou indo, nem vou tomar café! Vou dar uma passadinha na Octopus antes de ir pra aula, esqueci meu arranjo de cabelo lá ontem à noite...
- Então corra, corra! – o velho fez um gesto para que ela seguisse caminho. Maxine correu para a porta da cozinha.
- Use a porta da frente, Max! Que péssimo costume esse de ficar saindo pelos fundos! – ralhou a mãe – os vizinhos estão reclamando que você anda pulando as cercas das redondezas pelo menos três vezes por dia!
- Tomara que o cachorro da Dona Valéria te arranque um pedaço da bunda! – praguejou Gustavo.
- Gustavo! – fez Dominick.
- BUNDA! BUNDA! ELE DISSE BUNDA PAPAI! – gargalhou Alexandre jogando comida no irmão e no pai.
- E você não fique repetindo o que ele diz! – Stéphanie deu um tapinha na cabeça do filho.
- Não faça isso com ele Steph, ele é só uma criança!
Aproveitando a confusão, Maxine saiu pela porta dos fundos mesmo, fazendo o velho Umbrella que a tudo observava silencioso dar risadinhas baixas de prazer, voltando seus olhos para o livro.
A casa de Maxine imitava as velhas casas coloniais alemãs. Seu teto era pontiagudo, o último quarto no último andar era o dela, o da janela redonda. Apenas uma coisa fugia ao padrão da arquitetura: a torre prateada onde ficava o observatório do seu avô, lá onde havia tanta velharia e tanta relíquia. O terreno da família de Maxine era estranho, era circular, ficava no centro do quarteirão, seu acesso se dava por quatro vias, quatro corredores de arcos ornamentados com trepadeiras que começavam nas calçadas das quatro ruas que formavam o quarteirão. Cercada de arquitetura aerodinâmica por todos os lados e prédios altos fazendo sombra, aquela casa parecia simplória, fraca e medieval. O gramado era verde e cheiroso, quase não parecia sintético.
Sua mãe era muito ocupada, empresária freqüentadora assídua da sua firma, advogada muito eficiente, estava de contrato assinado com a empresa de uma conhecida milionária chamada Alberta Veronese, que fornece produtos alimentícios de fazenda para quase todo o país. Stéphanie costumava reclamar todo dia de como Alberta era truculenta e hipócrita, muito longe da imagem de velha senhora meiga que aparece na televisão. Mesmo assim, Steph tirava pelo menos uma hora do dia para cuidar do jardim encantado que ela havia construído com tanto amor logo que o marido comprara a casa, a única do bairro que mantinha a arquitetura original. O pai de Maxine era astrônomo. Ou melhor dizendo, astronauta mesmo. Estava de férias por enquanto, acabara de voltar de uma viagem de 6 anos que fizera às ruínas de Marte, onde os antropólogos e os arqueólogos analisam os resquícios de uma civilização antiga que ali habitou. Maxine não o via desde os 10 anos.

E eis então as ruas movimentadas de Neon City. As ruas repletas de robôs, repletas de gente, repleta de alienígenas também. Turistas de outras galáxias passando as férias, gente com cabeça de cavalo e gente com cara de peixe. Maquiagens pesadas, acessórios exuberantes, bizarrices do dia-a-dia, anomalias da moda. Roupas gritantes, figurinos berrantes, penteados malucos e impossíveis, era isso do que Neon City era, em base, feita. Ali a festa nunca parava, e nem o trabalho também. Enquanto uns se divertiam outros davam duro na manutenção dos computadores que aquilo tudo controlavam. Maxine ia tranquila em seu patinete motorizado, ornamentado por ela mesma, era coberto por um adesivo especial que tornava sua aparência vítrea, uma caveira coberta de strass descansava grudada no guidão do veículo, fazendo par com o capacete que tinha uma versão deste crânio em menor escala.
- Mas o que é aquilo? – Maxine freou uma rua antes da boate. Em frente a Octopus, dois enormes carros-tanque cor-de-rosa com os dizeres “Fazendinha da Tia Alberta INC.” nas laterais, em vermelho, utilizando de uma foto da dita-cuja fantasiada de vovozinha fechavam completamente a frente do estabelecimento. O dono da boate, Fernando, irmão mais velho de Miguel, estava esbravejando com Deus e mundo na calçada. Dois policiais usando os uniformes brancos com a cruz vermelha, o símbolo da ESFERA, estavam parados um de cada lado, fazendo escolta a um homem de rosto conhecido. Maxine acelerou.
- O que está acontecendo aqui?! – a garota largou o patinete no chão e correu até Fernando, abraçando-o pela cintura e voltando seus olhos para o grupo suspeito formado por dois policiais e três homens trajando os uniformes de caubói das empresas da velha Alberta Veronese.
- O que está acontecendo, Maxine? O que está acontecendo? Esses idiotas têm um documento que comprova que a empresa deles comprou o prédio da boate! É isso!
Os olhos de Maxine se esbugalharam, aterrorizados pelo futuro. Os dançarinos e os garçons (incluindo Miguel, ainda sem blusa e de gravatinha), até mesmo os freqüentadores da boate, começaram a sair e a se amontoar ao redor da cena, confusos, assustados, decepcionados. “a boate vai fechar?” eles perguntavam. Os passantes e pedestres também começaram a parar para ver o que estava acontecendo. Maxine, por reflexo, correu até o homem de preto que carregava a prancheta com o documento, pegou-o pelo colarinho e mandou as seguintes palavras:
- VOCÊ NÃO VAI FECHAR ESSA BOATE, NEM POR CIMA DO MEU CADÁVER!
Robert sorriu, sarcástico.

Fim da Terceira Parte!

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