Bem vindos à minha fábrica de sonhos!

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

The Big Machine 3 - Apocalipse 14


- Identificação exigida – repetia a voz, insistentemente. Uma luz do além iluminava seu rosto com uma potência sobrenatural distinta que o estava deixando tonto, até o escuro das suas pálpebras parecia um branco eterno graças àquela iluminação, bem em cima do rosto. Com detalhes, era possível enxergar cada veia da pele que recobre o globo ocular, cada mínimo detalhe da capa protetora da vista, das pálpebras, oscilando entre vermelho, laranja e amarelo, num carnaval de cores quentes e vivas. – Identificação exigida. – a voz insistiu. Christopher franziu o cenho e levou a mão sobre os olhos, que mesmo fechados, estavam sendo cegados. Teve vontade de dar um tapa naquela porcaria que estava produzindo barulho tão irritante, aquilo era um gravador? – Identificação de voz não confirmada pelo civil, iniciando scan facial...
A luz mudou repentinamente de branca para vermelha, num flash laser.
- Civil não catalogado no sistema, invasor alienígena! Código 4L13-N, ativar laser paralisador! – fez a voz metálica.
- Ah, mas você não vai ativar NADA! – aquela voz era humana, Christopher tinha certeza disso porque sabia que não era um aparelho que a estava reproduzindo, o que de certo modo era estranho porque ela ecoava numa frequência um pouco distante, talvez fosse a tontura do momento. O fato é que a voz precedeu a escuridão e uma série de tiros, alguns sons de metal sendo amassado e um tipo pequeno de explosão, alguns grunhidos e gemidos de luta corporal e por fim o som de sistemas elétricos entrando em colapso, o som do curto-circuito. Foi aí então que o rapaz sentiu-se, estava de cabeça pra baixo, e lembrava-se de quase nada, lembrava-se do momento em que saíra da sua dimensão, e lembrava-se do momento em que perdeu a consciência, quando teve a sensação interna de que estava esticando feito uma goma de mascar, e depois vieram as trevas.
- Você está bem rapaz? Está bem? – o homem o puxou pelo braço de mau jeito. Christopher gemeu. Era difícil abrir os olhos. – desculpa amigo, esqueci de soltar o cinto de segurança – deu uma risadinha e apertou o fecho, Christopher foi de cabeça ao teto do carro, que agora meio que havia se tornado o chão. Gritou. – Au! Meu Deus, desculpa! Ai, vem cá! – aos poucos, com jeitinho, ele foi saindo, sua vista ainda estava muito embaçada para poder enxergar alguma coisa, e o homem estranho mais o machucava que o ajudava. – ai, vocês são pesados! O que vocês andam comendo no passado hein?
- Nós... Não somos... Não viemos do passado... – gemeu a voz de Augusta em algum lugar ali próximo.
- Nós viemos de outra dimensão – a voz de Pietro parecia muito mais equilibrada e recomposta do que a dos dois restantes. Talvez ele fosse o que tivesse menos sofrido com a queda do De Lorean no outro mundo.
- Vamos ter que rebocar a máquina de vocês – ao abrir os olhos por completo, pela primeira vez, Christopher viu o homem apertar um botão ao lado do que parecia um relógio de pulso, e com o punho fechado, apontar o braço em direção ao carro capotado. Um laser azul escaneou o corpo do veículo, de forma extraordinária, aquela espécie de laser transformou cada parte do De Lorean em pixel, e como areia, eles foram sugados para dentro do relógio de pulso. Se é que aquilo poderia ser considerado um relógio. Pietro esfregou os olhos.
- Quem é você?! – exclamou Augusta.
- Eu? Me chamo Pietro Heinrich, muito prazer – ajeitou o cinto e estendeu um sorriso de orelha a orelha. O Pietro original entrou em estado catatônico naquele momento.
O De Lorean havia os levado para o meio do nada, o meio de um deserto, um deserto do outro mundo. Não havia sequer sinal de vida inteligente em quilômetros, exceto uma espécie de veículo policial num estranho formato oval, possuindo duas rodas, agora completamente destruído, com restos de robôs despedaçados ao redor. Pelo número de cabeças, eram dois... Mas espere... Havia algo de estranho naquelas cabeças, elas eram muito familiares aos três.
- Meu Deus! É a cabeça da Carminha! São as cabeças da Carminha! – exclamou Chris, arregalando os olhos e levando as mãos à boca, estava enjoado.
- Claro que não, seu besta, tá vendo que esses robôs tem a cara dela?! – fez Pietro, já revoltado, com uma bolsa de gel geladinho segura na testa, para aliviar a dor do baque. – ou tá pensando que a Carminha tem duas cabeças?!
Mesmo após aquele breve esclarecimento, tal visão ainda deixava Christopher Umbrella ojerizado, era repulsivo ver aquela cabeça de olhinhos apertados, queixo pontiagudo e dentes de catita longe de um corpo, era como se a própria Carmen tivesse sido decapitada a sangue frio, tal ideia o fazia tremer dos pés à cabeça e suar frio, era nauseante ver as partes daquele corpo franzino e magricelo – agora duplicado – todo espalhado pelo chão do deserto, num misto de metal, pele e couro rasgado, o couro sintéticos dos uniformes usados pelo que mais tarde o Pietro da outra dimensão descreveria como Células, os olhos e os ouvidos de The Big Machine, o cérebro do mundo.
O número de pessoas era superior ao número de transporte: havia um único veículo para a locomoção até o que aquele homônimo de Pietro, mais velho e mais magro chamou de “Fortaleza Digital de Asgard”, veículo este que para a surpresa dos três viajantes interdimensionais era exatamente igual aos que foram pilotados por Haruno de Lana na perseguição nos corredores dentro do que um dia fora o prédio da faculdade FAMA. Uma Planária, pouco maior do que as outras, bem mais robusta e aerodinâmica, quase ameaçadora, com a cabeça em forma de seta preservada, mais pontiaguda que a original, se é que a Planária do mundo de Christopher era mesmo a original. Seus ocelos usados como faróis eram bem maiores e iluminavam mais, suas laterais brilhava num azul noturno de neon incrível, era um banquete para os olhos, e o melhor de tudo: flutuava! Planava no ar!
- Vocês tiveram muita sorte, não podemos ficar aqui por mais tempo, já sabem que eu destruí aquelas duas – meneou o queixo em direção aos restos mortais dos androides-Carmen. – eles virão em um número muito maior, já devem estar a caminho.
- Mas eles são pequenos, você os quebrou praticamente com as mãos nas costas! – exclamou Augusta, chutando a cabeça robótica decepada.
- Porque eu sei qual o ponto fraco das Células, mas em quantidade superior a esta, elas são um problema. E põe problema nisso! – parecia preocupado, olhando para o horizonte, estava esperando os veículos ovais surgirem para o seu desespero – vai ser o jeito rebocar vocês até o posto avançado, eu não posso auto-rebocar, vou ter que fazer o percurso de Planária...
- Você está querendo dizer que vai fazer conosco o mesmo que fez com o De Lorean? – exclamou Christopher, levantando-se, ainda tonto. Não houve resposta, apenas ajustes no grande relógio negro de pulso.
- Ei! PELHA LHÁ! – fez Augusta, graciosa, levantando os braços para o alto – eu não vou ser teletransportada nem a pau! Vai que eu vou e minha cabeça fica! E aí? Como é que eu fico? Uma Augusta sem cabeça?! Vou ter que trabalhar de assombração e...
- Deixa de frescura menina, vai ser rápido e nem vai doer – fez Pietro, balançando a sacola de gel para ver melhor o conteúdo dela.
- E por um acaso você já foi teletransportado?! – retrucou.
- Não, mas viajei de uma dimensão para a outra, e se isso não me matou, o que vai me matar?!
- O Pietro tem razão Guta – intrometeu-se Chris, criando forças pra se levantar. – de setembro pra cá, nosso mundo e nós mesmos desobedecemos todas as leis da lógica e da física! O que mais pode dar errado?!
Os três voltaram suas cabeças para o Pietro mais velho, que fez uma careta e deu de ombros.
- Decidam, ou fiquem aqui ou vamos para o posto avançado, as Células devem estar chegando... – apontou para o horizonte iluminado por uma luz espectral misteriosa, que parecia ter origem há quilômetros de distância. A noite estava escura e fria, exceto por aquelas luzes alienígenas estranhas que dançavam no céu do deserto.
Poucos segundos depois, o som ameaçador de motores pneumáticos roncando há quilômetros de distância se fez ouvir através do eco que aquelas colinas áridas proporcionavam.
- Ô boca maldita hein! – esbravejou Augusta. – vamos, me desmembra logo! Prefiro morrer teletransportada do que morrer nas mãos de robôs interdimensionais com a cara da Carminha! Já pensou que sacanagem?!
O Pietro mais novo e mais gordinho soltou uma gargalhada alta que ecoou por quase todo o deserto. Em dois tempos os três não estavam mais lá, num piscar de olhos o mundo ao seu redor se transformou da noite escura e fria do deserto para um galpão escuro e abafado repleto de máquinas inutilizadas e empoeiradas. O enjoo veio logo em seguida, os três vomitaram quase que em sincronia. Foi tudo rápido demais, vultos negros segurando metralhadoras, lasers e outras armas potentes de grosso calibre amontoaram-se ao redor dos três, mantendo-os na mira, um movimento em falso e eles seriam fuzilados a sangue frio.
- Quem são vocês?! – urrou um dos vultos. A iluminação era parca e fraca, impossível distinguir quantos eles eram, podiam ser dezenas, centenas, o galpão era enorme, a única maneira de saber a quantidade de homens armados era conferindo os pontos vermelhos que se distribuíam dos pés à cabeça em Christopher, Augusta e Pietro, marcando os alvos: braços, pernas, barrigas, pés, porém nenhum deles possuía a paciência ou o tempo necessário para tal banalidade, estariam mortos antes de pronunciarem paralelepípedo em russo caso esticassem um dedo sequer para coçar o nariz. As mãos para o alto, as testas suadas, as bocas escorrendo o restinho do vômito do teletransporte, Augusta chorava copiosamente.
- Nós viemos de outra dimensão! Precisamos de ajuda! Precisamos de ajuda! – gritava Christopher para o nada, sua voz reverberando no metal, no ferro, no chumbo, ecoando e se multiplicando, aumentando e diminuindo conforme executava suas curvas sônicas através das trevas. Os soldados armados na escuridão mantinham-se imóveis, inexpressivos e impassíveis, era uma angustiante e desesperador, Pietro já havia fechado os olhos e entregado sua alma aos Orixás, entoava baixinho algum cântico que aprendera nas tradições da família. Por ironia do destino, haviam eles sido enviados para dentro do quartel inimigo? Para dentro daquilo que o povo daquela dimensão chama de The Big Machine? E se tudo aquilo que fora dito há alguns minutos atrás fizesse parte de um plano para encurralá-los e mata-los? Eles estavam perdidos, seu mundo estava perdido, afinal eles eram a última esperança de Macapá, talvez do mundo inteiro!
- Outra dimensão?! – urrou a voz outra vez – LIGUEM OS REFLETORES!
Jatos de luz acertaram os rostos sujos de terra e suor em cheio, retinas feridas, olhos lacrimosos e mãos levadas ao rosto, em reflexo, para proteção, feito criaturas vampiras expostas ao sol, ajoelharam-se e contorceram-se, talvez por susto, talvez por medo, talvez entregando-se à morte iminente.
Nas trevas, passos silenciosos, abafados por uma sola de material estranho, caminhando para a luz. Uma espada de samurai nos ombros, um uniforme amarelo colado ao corpo, óculos escuros e headphones no formato cômico de orelhas de gato, dando o último toque de excentricidade ao ser que parecia ter saído diretamente dos filmes de Quentin Tarantino para o mundo real. Cabelos escuros longos desciam até o meio das costas, um relâmpago negro pintado no rosto, abaixo do olho esquerdo, talvez para disfarçar alguma cicatriz de luta, ou talvez apenas por charme e vaidade pessoal. O que era aquele ser andrógino? De que mundo aquilo havia saído?
- Bem vindos, viajantes! – disse, jogando a espada para um dos soldados, que a apanhou numa demonstração de reflexo perfeito, direto no cabo, sem hesitar.
- Quem é você? – gaguejou Christopher.
- Eu? – a criatura gargalhou, retirou os óculos escuros e jogou os cabelos para trás. Christopher e seus amigos entraram em estado catatônico quase que instantaneamente. Seu anfitrião não precisava abrir a boca para dizer mais nada, tudo era muito claro. Claro como água, claro como um puro cristal, como um diamante, transparente como um fantasma, não eram necessárias explicações ou acréscimos, porque uma imagem vale mais do que mil palavras, e um único rosto vale por um universo inteiro delas. – EU SOU VOCÊ!


Fim do Apocalipse Catorze!

















Mais um Apocalipse surpresa
Para os leitores deste blog
Eu adorei esse capítulo
O fim está próximo! Aguardem!

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