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quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Veronica's Secret


- Entre, Stefan – grasnou a velha. Ela sabia que seu filho estava para do outro lado da porta pelo modo como seu punho tocava a madeira, ela reconhecia a batida de cada um deles. A batida de Aline era sonora, a batida de Gabriela era nervosa, e a de Stefan era firme. Riu consigo mesma. O que Gabriela estaria fazendo na mansão? A não ser que tivesse fugido da prisão, estaria disposta a fazer sua sogra “amada” de refém, com certeza.
- Está arrumando as malas, mamãe? – Stefan pareceu surpreso, sentou-se à beira da cama acariciando a pelagem comprida e macia do gato felpudo de cara preta que balançava seu rabo de espanador de um lado para o outro. Estava nervoso e agitado por ver sua dona sempre tão lenta, assim, tão vivaz como naquela manhã. A coluna da velha não dava sinal de vida há algumas horas, e já era seguro fazer alguns movimentos mais audaciosos, como agachar para encher a bagagem com suas vestimentas favoritas.
- Claro, não confio em mais ninguém depois de toda essa história. Você não pode imaginar o estado do meu psicológico nesse exato minuto... – ela deu uma pausa e escorou-se na penteadeira, acendeu um cigarro enorme e soltou uma baforada no ar – estou pensando sinceramente em me deitar e morrer logo de uma vez.
- Vai morrer mais rápido se continuar fumando essas coisas, mamãe – Stefan levantou-se e tomou o cigarro da boca de sua avó-mãe, caminhou até a varanda e sugou o máximo de fumaça que pode para dentro dos pulmões, ferindo tudo com a maldita e viciante nicontina.
- Eu posso morrer, você não, é jovem ainda – ela acendeu outro. A esta altura, o quarto era uma verdadeira sauna, cheia de fumaça.
- Eles rastrearam o meu celular e o encontraram, acredite se quiser, em Cingapura!
Stella gargalhou, a mesma gargalhada de esponja de aço, um pouco mais macia.
- Na posse de quem? – perguntou ela, como se desinteressada, mas no fundo, cheia de curiosidade.
- Estava largado no aeroporto, no fundo de uma lixeira! Acredita nisso?! – foi a vez de Stefan gargalhar, virou-se para a velha mãe. – a Interpol foi acionada, mas duvido que vão achar o verdadeiro assassino do tio Lucas... Como vão achar um assassino sem rosto? Não sabemos quem é... E a Gabriela...
- Ora, não toque no nome dessa maldita dentro do meu quarto! – Stella escarrou num lenço e jogou-o com asco dentro do lixeiro. Para ela, não era o seu catarro contaminado que estava indo para o meio das porcarias, era Gabriela. Não passava de gosma asquerosa. Baixa.
- Ela preferiu pegar prisão perpétua a revelar o verdadeiro mandante do crime... – resmungou ele, cabisbaixo. – ela assumiu a culpa sozinha...
- Veronica nunca iria mentir, jamais mentiria...

- Não tenha medo, Veronica, tudo bem? Estamos somente eu e você aqui dentro desta sala, e não há ninguém do outro lado do vidro, eu pedi a todos que saíssem para que você pudesse me contar o que de fato é a verdade... – o detetive segurava o rosto da mulher entre as mãos. Ela ainda tremia, mas inexpressiva. Suas lágrimas rolavam soltas como rios pelo seu rosto fixo e vermelho. – está pronta?
Ela fez que sim.
- As mensagens começaram há uma semana... – começou Veronica, já um pouco mais calma, após um longo e apreensivo silêncio – eu sempre tive uma paixão oculta pelo Senhor Stefan, mas nunca fui corajosa para admitir, e quando as mensagens começaram a chegar, eu me senti a mulher mais sortuda do mundo! Eu estava nas nuvens!
“Eu estava disposta a tudo o que ele me pedisse, eu jamais negaria qualquer coisa... E derramei muitas lágrimas quando ele me pediu que o ajudasse nisso... Eu não conseguia imaginar o porquê de o Senhor Stefan querer a mãe morta! A sua mãe! Aquela que ele mais amava no mundo todo e que o acolhera após a triste morte de seus pais! Que lhe sustentara, que lhe dera do bom e do melhor, que lhe dera carinho e apoio nos mais distintos momentos da vida! Eu simplesmente não conseguia entender! Eu não conseguia chegar a um ponto lógico disso! Ele não podia estar de olho na herança, ele era rico por si próprio! A carreira como ator lhe rendera rios de dinheiro e agora isso! Por quê? Eu me perguntava, e várias vezes lhe pedi que me tirasse dessa.”
- Então foi tudo um grande engano! Lucas morreu no lugar de Stella! – o detetive estava bestificado.
- Sim – prosseguiu Veronica, agora segura de si mesma. – As instruções eram estas: eu deveria estar esperando no corredor, próxima do elevador, pronta para indicar o número do quarto aonde a Senhora Stella estaria naquela manhã... Mas de última hora eu senti que não deveria fazer isso! A Senhora Stella me deu casa e emprego quando cheguei a este país, ela era um pouco ranzinza e respondona, mas era como uma mãe para mim... Ela me ensinou muitas coisas...
“Havia uma lista com os quartos e quem iria ocupá-los, e como a Senhora Stella vivia falando desse Lucas, o único nome que me veio à cabeça foi o dele, e o número de seu quarto, que foi o primeiro em que bati os olhos na listagem do hall! Entenda, por favor, que eu estava nervosa e muito comprometida, e não tinha outra saída, eu poderia ter dado um número qualquer, de qualquer outro quarto, mas eu não poderia deixar um daqueles velhinhos indefesos morrerem, velhinhos que nem sequer fazem parte desta história toda... Foi doloroso para mim, e pedi perdão à Deus milhares de vezes enquanto o elevador descia. Eu estava gelada e arrependida de ter feito o que havia feito... Por isso eu peguei os sapatos do Senhor Lucas das mãos de uma assistente e subi para tentar reparar o erro, mas quando cheguei... Era tarde demais!”

- ELE ESTÁ MORTO! ESTÁ MORTO! – urrava a búlgara apontando para o cadáver ensangüentado que se debatia coberto pelo vestido branco, agora rubro.
- VOCÊ VAI FICAR CALADA, ENTENDEU? CALADA?! VOCÊ NÃO VIU NADA DO QUE ACONTECEU AQUI! NADA! – sibilava Gabriela, feito uma cobra venenosa, enquanto sacudia os ombros da indefesa Veronica com violência, empurrando-a porta afora em seguida, antes de descer desembestada às escadas de emergência.

- Eu não vi outra solução se não me esconder – disse Veronica ao detetive, limpando as lágrimas. Sua fala estava fluente e os soluços eram raros agora. – eu me escondi no escuro do corredor e vi o momento em que o Senhor Stefan abriu a porta e deparou-se com cadáver, eu o vi correndo pelas mesmas escadas de emergência por onde sua esposa fugira... Nessa mesma hora eu soube que havia sido enganada, que ele não matara o Senhor Lucas... Aconteceu tudo tão rápido
- Gabriela estava em posse da arma? – perguntou o detetive.
- Não, ela estava de mãos vazias.
- Como você passou batido por Stefan? Ele esteve jogado no chão, próximo ao elevador durante algum tempo...
- Usei o elevador de serviço, ficava mais próximo do quarto do Senhor Lucas... logo ao lado, no pequeno corredor... À esquerda...
- Sim, sim, logicamente... Mas me conte sobre o telefonema de hoje pela manhã... – o detetive olhou no relógio. Já passavam das duas da madrugada – de ontem de manhã, digo.
- Senhora Gabriela me ligou e mandou que eu ficasse quieta, disse que alguém queria falar comigo e que eu ouvisse com atenção... O homem do outro lado não disse seu nome, mas disse que se eu abrisse a boca, estava morta antes de me dar conta, e se eu não o respeitasse, ele mataria a todos nós... – Veronica voltou a chorar, dessa vez baixinho, um choro silencioso. – Não sei quem ele era, mas ele e a Senhora Gabriela estavam juntos nisso, eles se fizeram passar por Stefan para que eu acreditasse realmente que ele queria a herança da mãe, e que confirmasse a história aqui, na polícia...
- Está dispensada, Senhorita Petrova – e saiu porta afora, para nunca mais voltar.

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