Bem vindos à minha fábrica de sonhos!

domingo, 29 de novembro de 2009

THE BIG MACHINE - PARTE 6!


Ao irem cada vez mais a fundo no túnel, novos universos foram se abrindo, e em poucos segundos eles giravam dentro de um grande caleidoscópio psicodélico onde até o mais esperto e calculista se perderia. Mas não aquele misterioso piloto, não ele. Ele sabia o caminho de cor. Sabia como ignorar aquelas ilusões geradas por computador, e por este motivo eles adentraram numa câmara oval, que fechou-se e lançou sobre eles uma espuma gelada, que resfriou as vestimentas que naquele momento estavam ardendo em altas temperaturas por causa da velocidade a que estava. Os indivíduos que as usavam não sentiam o calor por causa do sistema de refrescamento interno. Ali naquela câmara os três desceram da Planária, e após um scanner de raios vermelhos que os analisou de cima a baixo, vindos do nada, portas metálicas se abriram para um grande galpão.
“Saudações de C0MPyou-T3R a Saturno Revenge e Hanako Hanajima!” disse uma agradável voz delicada quase infantil e nada metálica, vinda do vazio. Era a voz da rede particular de Asgard. “Bem vindos de volta ao lar!”. Os olhos de Christopher saltaram das órbitas, seu coração não estava preparado para o que viria a seguir. Lá dentro, dezenas e mais dezenas de homens vestindo uniformes negros de borracha e óculos vermelhos como os que o Pietro do Futuro usava quando chegara do nada à escola esta manhã. Uns pilotavam braços mecânicos gigantescos, outros tinham em mãos maçaricos poderosos, outros faziam testes em automóveis futurísticos inacreditáveis que rugiam poderosos e animais.Tudo ali era um carnaval, um grande carnaval de sons metálicos, cores, faíscas e música, muita música. Algumas garotas muito jovens dançavam divertidas no alto de uma plataforma móvel, distraindo-se enquanto não voltavam a trabalhar no software do sistema interno do robô gigante parado no centro do galpão. Ali tudo era diversão, nem parecia que o resto do mundo era caos e opressão, ali havia um mundo particular e interno de milhares de pessoas que tentavam viver uma vida normal em meio à toda aquela destruição de sonhos e futuros. Uma de suas músicas favoritas tocava alto no som, "The Cycle" de Emilie Simon, sexta música do CD que, ora vejam só, levava o nome de The Big Machine. A maioria das músicas desse CD são críticas ao grande sistema em que a sociedade nos força a permanecer, lançado há 20 anos atrás, em 2009, se tornou praticamente o hino daquelas pessoas, o hino daqueles jovens que ainda nutrem fortes esperanças por um futuro livre de opressão, e permeado pela expressão.
Christopher se sentia um pouco culpado por aquele futuro triste, de certo modo. Pois na época em que ele vivia, a liberdade de expressão era mais do que permitida, era expressa e tangível a qualquer um que soubesse lutar pelo que queria, e agora aquelas pessoas estavam ali, de braços atados, trabalhando internamente para vencer o sistema cruel e mortal de The Big Machine;
Os olhos de Chris dançavam por entre as maravilhas tecnológicas daquele lugar utópico, era inacreditável. Ele entendia muito pouco sobre robótica ou tecnologia, não sabia como funcionavam as coisas nem como montá-las, e era fantástico ver aquelas pessoas trabalhando normalmente como se respirava, quase em sincronia com as máquinas, com o futuro no sangue. O robô gigante era humanóide, era mais uma armadura gigantesca do que um robô, uma armadura de castelo, da era medieval, em tamanho família, pois ao contrário do que acontecia com o robô-carmen gigante, a fiação não estava solta externamente, estava bem oculta, guardada por trás das placas de ferro cintilantes como cristal, protegida. Talvez por ser um robô muito novo.
Mas então a música parou, e todos deixaram de lado o que faziam, largaram maçaricos ou chaves de fenda, raios lasers e alicates, voltando-se para uma porta de metal que se abrira naquele exato momento, de supetão. Uma gritaria começou, houve rebuliço geral e muita confusão. Como houvessem esquecido que Christopher estava ali, Fábia Paola e o estranho piloto correram para as escadas mais próximas, abrindo espaço entre a multidão de pessoas que se aglomerava aos montes tentando subir para a plataforma do segundo andar, a fim de ver do que se tratava todo aquele alarde, todo aquele choro, aquela confusão. Christopher estava com o coração na mão, morrendo de preocupação. E se tivesse acontecido algo a Pietro? O garoto foi atropelado várias vezes por pessoas que ignoravam sua presença ali, de modo que ele acabou sentado dentro de um Subaru 2028 totalmente projetado para planar, num estranho formato que lembrava uma lagosta.
"Por favor, pessoal, afastem-se e se dispersem! Por favor! Precisamos de espaço! Temos um combatente ferido! Um combatente gravemente ferido, e vocês estão obstruindo a passagem do laboratório!" disse a infantil voz outra vez.Sem entender nada, Christopher desviou sua atenção do estranho banco onde havia caído sentado para as pessoas aglomeradas. Numa maca cinza, empurrada por dois paramédicos de preto, diferenciados do resto pelas braçadeiras vermelhas, estava estendido o corpo de uma mulher, ladeado por uma desesperada e chorosa Fábia Paola, que esperneava e gritava palavras desconexas, ordens que eram ameaças e pedidos de socorro. Seu rosto já abatido estava vermelho, completamente molhado pelas lágrimas, exatamente como era há 20 anos atrás, quando ela costumava chorar dentro da sala de aula, seu rosto retorcido pelo choro causava mais dor agora do que antes. Era terrível. Estendido na maca estava um tronco, um tronco sem pernas, tendo somente parte do flanco esquerdo e da cintura pra cima. Os cabelos escuros cacheados caíam para fora da maca como uma cascata negra sedosa e perolada como o céu noturno, seu rosto elegante, nobre e moreno, rosto forte e intenso, sensual e ao mesmo tempo repreensivo, estava pálido e quase inexpressivo. Sua boca seca quase branca por causa da perda de sangue se entreabria vez ou outra, tentando balbuciar pedidos de água. Seus olhos revirados escondiam as pupilas, ela estava delirando, estava dando seus últimos suspiros. A sua beleza e o seu porte lembravam uma poderosa e atraente orquídea, uma orquídea que estava morrendo, uma mais velha e ainda mais bela Ray Ann estava morrendo.
Christopher entrou em estado de choque, não conseguia se mexer, não conseguia respirar, o ar lhe faltava. Não só porque agora ele sabia que sua quase irmã Ray Ann morreria num futuro próximo, mas porque o misterioso piloto havia tirado seu capacete.
Não havia mais mistério, o piloto era ele. Era Christopher Umbrella. Um Christopher Umbrella muito mais velho, um Christopher Umbrella de rosto endurecido e sobrancelhas unidas sempre, um Christopher Umbrella mal-encarado e sisudo, estressado e preocupado. E aquilo lhe chocou profundamente, e magoou seu coração em dobro, em triplo, em quadruplo. Seu rosto era exatamente com o de seu pai: objetivo e cheio de preocupação, estressado e quase agredido. Como isso aconteceu? Porque isso aconteceu? Porque Ray Ann estava agonizando?
- O QUE ACONTECEU COM ELA, SEUS FILHOS DE UMA $*%#@?! – gritava ele, seus cabelos ainda escuros e já bem poucos, sem aquele volume da adolescência, grudavam na testa suada e franzida de preocupação. Os outros refugiados se curvavam com seus gritos, recuando mais de dez passos, abrindo clareiras às pressas naquela floresta de árvores escuras de borracha. E aqueles que participaram da operação em que Ray Ann sofrera o acidente choravam de remorso e medo.
- Nós não conseguimos chegar à tempo! Tivemos problemas com os Cefalópodes!
- QUE SE EXPLODAM OS CEFALÓPODES! SÃO ROBÔS DE NÍVEL OITO! SEUS INCOMPETENTES! COMO VOCÊS NÃO CONSEGUIRAM DERROTAR CEFALÓPODES A TEMPO?????!!!!!!
- Eles eram muitos, senhor! E quando chegamos à Câmara de Julgamento, já haviam aberto as portas da trituradora! Todas as Células do recinto nos atacaram ao mesmo tempo, por pouco não saímos de lá mortos também e...
- CALA ESSA BOCA! – ele desferiu um tapa no rosto do garoto, que caiu praticamente desacordado no chão. Ray Ann ainda conseguiu se segurar na borda da trituradora antes de cair no buraco, mas suas pernas não foram salvas. – CHAMEM OS MELHORES CIRURGIÕES! CHAMEM OS MELHORES TÉCNICOS EM MECATRÔNICA! QUERO QUE MAURICE E A EQUIPE DELE CUIDE PESSOALMENTE DOS SISTEMAS INTERNOS DELA! QUERO UMA ROBOTIZAÇÃO URGENTE! SUBSTITUAM TUDO POR METAL E TECIDO SINTÉTICO! EU QUERO ELA VIVA! JÁ! – o silêncio era mortal, assustador, cadavérico, nefasto, quase material. Christopher não conseguia mexer um músculo, era como se o seu pai gritasse com ele como nunca gritara, pela primeira vez.
Os paramédicos de preto correram em direção às portas automáticas de ferro cromado e cristal em faixas, o Christopher mais velho os seguiu de perto. Fábia Paola estava abraçada a alguém muito familiar. Sim, aquela era Suzannah, seus cabelos longos, de mechas mescladas castanhas e loiras a entregavam. O formato do seu rosto não havia mudado muito. A diferença estava nas rugas de expressão, porque seu rosto liso e perolado da adolescência parecia quase o mesmo. Ela parecia não sorrir a muitos anos, e tinha uma cara doente, não fosse pelo blush que ela nunca, nem em situações como aquela, dispensara a maquiagem. Continuava a mesma Suzannah de sempre. Uma mão misteriosa despertou Christopher de seus devaneios assustados, era Pietro, com roupas novas, camiseta e calça preta.
- Que susto você me deu! – exclamou Chris em voz baixa.
- Ei, sabes quem estava na maca agora a pouco? Eu não cheguei a tempo de ver quem era... Ouvi uns gritos teus...
- Não, não eram meus... Na prática não, mas na teoria, era sim...
- Era o Christopher do futuro? O que aconteceu por aqui então para ele estar tão furioso? Pelo que me contaram, foi ele quem ordenou a construção dessa fortaleza e uniu o exército da Rebelião...
Christopher não contaria para o amigo daquele jeito. Não ali. Não naquele momento. Era algo cruel demais para ser dito. Não que Ray Ann estivesse morta, mas no estado em que ela se encontrava, era impossível pensar num possível milagre. A não ser que a tecnologia daquele lugar já tenha chegado a tal ponto tão rapidamente. Em vinte anos.
- É melhor que você não saiba... Não agora...
Suzannah os estava observando desde muito cedo, observando com a curiosidade de um filhote aos dois. Aqueles dois indivíduos tão estranhos e deslocados, mas mesmo assim tão íntimos dela, seus rostos, suas expressões, suas vozes, era como voltar aos bons tempos, aos tempos de praça, de shopping, de música e de risadas. Seu coração acelerava toda vez que um dos dois subia uma oitava na voz. Eles eram como a válvula de escape daquele mundo terrível que havia tomado a sua volta. Estava tranquila quanto à amiga, ela estaria totalmente recuperada em vinte dias ou mais. Era preciso muita paciência para religar todos os nervos aos novos sistemas artificiais de fibras ópticas e titânio. E então ela se aproximou.
- Olá, meninos... – ela estava um pouco tímida, mas tinha um recado para dar. – fomos todos convocados para uma reunião de emergência daqui a duas horas, então, tenho de tomar conta de vocês até lá, para que não se metam em confusão.
- Como assim, confusão? – Christopher olhou para Pietro. Ele era o motivo. – ah, entendo...
Pietro sempre foi famoso por causar grandes desastres, desde que se entende por gente, sempre foi o mais desastrado. Suzannah os guiou pelos perfeitos corredores brancos internos da fortaleza. Aquilo parecia mais um hospital do que uma instalação qualquer. Volta e meia, eles cruzavam com um pequeno robô faxineiro que lembram muito o R2D2 de Star Wars, alguns Cefalópodes reprogramados para servir à fortaleza e gente com membros mecânicos. Aquilo os assustava bastante. E se por acaso um deles acaba voltando pro passado com um braço de metal? O que os pais deles diriam?
- Todo mundo por aqui tem um membro de ferro ou algo do tipo, ou isso é moda? – brincou Pietro. Suzannah lançou-lhe um olhar quebra-parede. Ele engoliu em seco. Havia dito besteira.
- Estamos na área de recuperação. – ela disse um pouco sorridente, aliviada por ter iniciado uma conversa com seus amigos de tanto tempo, coisa que ela não tinha tempo para fazer naquela confusão, porque o Christopher do Futuro era sisudo e calado, e Pietro do Futuro era super sofredor e não parava de viver da autopiedade, e isso a agoniava. – essas pessoas passaram pela cirurgia, que dura de três a cinco dias, e estão em fase de testes pra ver se conseguem se adaptar a vida cibernética!
- Isso é bem legal... E como a tecnologia avançou tanto em tão pouco tempo! – exclamou Pietro espremendo a cara contra um painel de vidro que se estendia por boa parte do corredor. Aquela ali era a ala de reparo dos membros cibernéticos. Haviam três pessoas sendo consertadas simultaneamente, duas delas estavam sendo reparadas por robôs-cirurgiões e a outra estava sendo tratada pessoalmente por um mecânico. Era sinistro, surreal. E deixando tudo isso para trás, os três continuaram seguindo corredor adentro.
- Avançou mesmo, até eu me surpreendo de vez em quando... É porque antes, até a noite passada pra ser mais exata, os robôs já faziam parte do nosso dia-a-dia, mas não tanto como nos outros estados ou fora do país, aqui a robótica ainda estava chegando... E então quando eu me acordo, as coisas já chegaram a este ponto... – Suzannah parecia perdida, desnorteada com tudo aquilo e sem reação. – eu ainda não consigo entender direito o que aconteceu... Me explicaram, mas eu achei... idiota demais! – ela fez uma careta como se recusasse algo. Christopher se aproximou alguns passos a mais. Estava curioso. Ainda havia muitos pontos soltos naquela história.
- O que te disseram? – perguntou Pietro. Suzannah hesitou, perguntando a si mesma se era certo contar a eles, se por um acaso aquilo não desacataria alguma ordem de Christopher, mas por fim, como era muito faladeira, cedeu ao apelo fraco, toda desconfiada, fazendo caras e bocas, como sempre fazia.
- Me disseram que o Pietro... Que não é você!
- Sim, nós sabemos! – exclamou ele. Queria logo partir para os finalmentes.
- É porque é muito estranho falar de você para você sendo que você realmente não é o você a quem eu estou me referindo e...
- ANDA SUZANNAH! – exclamaram os dois em coro. Era, Suzannah continuava a mesma.
- SIIIM! Me disseram que o Pietro era o primeiro nome de uma lista que continha os primeiros seres humanos a testar a máquina do tempo... – tudo se calou e eles se aproximaram mais, a voz de Suzannah era um sibilo praticamente – só que cada pessoa tinha o direito de voltar a um único momento do seu passado, sem poder alterar nada, somente para observar, por isso foram escolhidas pessoas extremamente profissionais e de confiança, dizem que os testes para escolher os caras duraram mais de três anos! E então o Pietro foi o primeiro a testar a tal máquina, e escolheu voltar pra noite em que ele perdeu o celular...
Pietro e Christopher se entreolharam arrepiados. Exatamente como ele tinha dito que faria um dia antes de tudo aquilo acontecer! E pelo visto, ele ficara com a ideia na cabeça esse tempo todo. Que grande loucura!
- Ele descobriu o que aconteceu com o telefone, finalmente... Você o tinha deixado cair – ela apontou para Pietro – e Pietro pegou do chão, e o trouxe para o futuro... Não era aconselhável, mas os cientistas analisaram a linha dos fatos e concluíram que aquilo tinha de acontecer mesmo, já que já estava registrada a perda do celular na memória de todo mundo...
- Sim, e o que mais aconteceu? – tudo estava batendo. Todas as especulações que eles haviam feito na quarta feira agora estavam se realizando.
- Acontece que a Carmen disque era faxineira do laboratório, e invadiu a sala da máquina do tempo! – ela parecia muito assustada agora, muito nervosa.
Pietro deu um tapão na testa. Christopher levou a mão à boca.
- Ca... ramba... – exclamou um dos dois, não importava quem fora, agora a situação estava sendo finalmente esclarecida por completo. As pontas soltas estavam sendo ligadas umas às outras como se pelas faíscas de um dos poderosos maçaricos que operavam nos robôs do galpão.
- Foi! – continuou Suzy – e então ela voltou no tempo e, detalhe, ninguém sabe como ela conseguiu operar a máquina sozinha... Porque ela não é lá muito inteligente...
- Suzannah – ribombou aquela estranha voz de antes. Aquela voz esnobe e severa que gritara há pouco tempo no galpão, com a chegada do corpo semi-triturado de Ray Ann. Christopher Umbrella, o Saturno Revenge, estava ali atrás do grupo. A pergunta a se fazer naquele momento era: Desde quando ele estava ali?

Fim da Parte Seis!


sábado, 28 de novembro de 2009

THE BIG MACHINE - PARTE 5!



Tudo era fumaça e destroços, tudo era nada e destruição, o superaquecimento do motor que mantinha o moinho de vento voando gerou várias explosões poderosíssimas, que lançavam Christopher cada vez para mais longe, agarrado à palheta, o vento e o calor o sopravam para longe, e em pouco segundos ele estava a metros de distância das explosões, caindo e caindo em direção ao cerrado abaixo de seus pés, pensando nas pedras que atingiriam seu corpo com toda a força, que o quebraria em várias pedaços internamente, pensando nos espinhos das árvores secas e tortas da terra pobre que iriam perfurar a sua pele e a sua carne. Aquilo só poderia ser um pesadelo, um grande pesadelo. Porém, antes que ele visse a luz do céu nesta realidade alternativa tão desconexa e paradoxal, algo o ergueu, algo lhe sustentou, e este algo o estava içando pra cima em alta velocidade. Um par de mãos lutava para mantê-lo seguro, a vista estava muito embaçada, tudo eram vultos de mata, de pedras de barro, de folhas e de destroços.
Vultos negros, rostos estranhos, traços perfeitos e lisos de uma máquina de última geração, pontos luminosos. Ele estava planando a poucos metros do chão em uma moto, mas não era uma moto qualquer, era uma Planária 3XD, exatamente igual ao Platelminto que dava nome a este meio de transporte movido a nitroglicerina, içado por um fogo azul infernal.
- Segure-se! Seu idiota! Não está vendo que estamos tentando te salvar?! – gritava uma voz conhecida, mas um pouco mais grossa. Meu Deus! Aquela era Fábia Paola! Era uma Fábia Paola muito magra e abatida, mas era Fábia de sempre, aqueles enormes seios não deixavam dúvidas! Seu cabelo agora era liso e curto, na altura das orelhas, um Channel futurístico, pintado de roxo, do jeito que ela sempre sonhara desde a adolescência. Mas seu rosto, havia algo de diferente em seu rosto. E não era só a magreza.
A coisa lá longe rugia. O cara que acelerava com ferocidade a Planária, puxou uma esfera negra do bolso, apertou um botão vermelho no topo da bola, este piscou várias vezes, e poucos minutos depois de lançá-la em direção ao robô enferrujado gigante, esta explodiu em um show de luzes vermelhas, atingindo a grande máquina velha em cheio. A versão mecânica de Carmen Parafuso tombou para o lado, uma das suas pernas fora perdida na explosão. Pelo visto, pensou Christopher, aquela granada tecnológica era muito potente, porque cada perna da engenhoca tinha mais de dez metros de altura! Era praticamente um edifício em movimento.
- ONDE ELES ESTÃO? – gritou o piloto, um tigre rugindo. Christopher arrepiou-se. Em meio à ventania louca, ao rugido metálico da Planária, e às explosões, ele mal podia ver o mundo direito ao ser redor, tudo era apocalipse, tudo era caos, as coisas estavam de cabeça para baixo, literalmente, pois a moto voadora agora voava de ponta-cabeça. Nesse meio tempo, Chris pôde ver mais três motos idênticas àquela, voando como falcões famintos por justiça, em sincronia, lisos, aerodinâmicos e prateados, aves cheias de luzes azuis na dianteira e nas laterais. Que lindas elas eram!
- EU NÃO SEI! EU NÃO SEI! EU NÃO OS ESTOU VENDO! ACHO QUE PIETRO LEVOU O FARELO!
- NÃO! AINDA NÃO! ELE NÃO PODE FAZER ISSO AGORA! NÃO PODE NOS DEIXAR NA MÃO! ELE QUE COMEÇOU ISSO!
- ESPERE! ACHO QUE VI ALGO CAINDO NAQUELE PEQUENO BOSQUE MAIS ADIANTE!
A moto acelerou com mais força. Muita força. Christopher quase sentiu seu coro cabeludo por pouco não ser arrancado. Agora ele não podia ver nada, porque sua cabeleira escura havia se transformado numa máscara que tapava completamente a sua visão, ele estava de costas para o vento. Em lapsos e espaços entre uma mecha e outra, ele podia ver o robô entrando em combustão, suas peças pesadas de bronze e ferro caindo como restos de um prédio demolido. Porém, uma coisa macabra aconteceu, uma coisa pavorosa e inesperada, que fez seu coração saltar e seu peito gritar automaticamente.
A cabeça do robô, de olhos de esmeralda, desprendeu-se do resto do corpo robótico, criou oito pernas de titânio como as das aranhas e caiu no chão duro com um sorriso perverso, lançando terra, pedras e barro para todos os lados e pondo-se a perseguir a Planária em uma velocidade absurda. O barulho de suas gigantescas pernas aracnídeas destruindo o chão do cerrado era infernal. Aquilo arrepiou Christopher dos pés à cabeça! Era assustador! O barulho do metal se aproximando era desesperador.
- AI! AI! EI! VOCÊS AÍ! OLHEM PRA TRÁS PELO AMOR DE DEUS!!!! – esperneava Christopher – A CABEÇA DAQUELE VILÃO DO DESENHO DO MÁSCARA ESTÁ CORRENDO ATRÁS DE NÓS NESSE MOMENTO! SÓ QUE AGORA NÃO É NEM UM POUCO PEQUENA!!!
Fábia gargalhou, puxou uma das granadas, apertou o botão vermelho e lançou. A explosão gerou uma onda de calor terrível que quase queimou o rosto de Christopher, se não fosse um pano preto que lhe atiraram para que se protegesse. Aquilo não adiantou. Meia cabeça continuava os perseguindo. Fábia gargalhou mais ainda. Pra ela aquilo era cômico, mas para ele era desesperador! Agora ele gargalhava, sim, mas de nervoso. Já pensou? Metade da cara da Carminha correndo atrás de você montada em patas metálicas de aranha? Que horror!
- Oi? – disse o piloto, colocando dois dedos sobre o ouvido, deveria ser alguma espécie de fone comunicador ou algo parecido – graças a Deus! Estamos indo para a Fortaleza Tecnológica de Asgard agora mesmo! – sua voz tornou-se um pouco mais alta agora, era para que Fábia ouvisse sua ordem – GAROTA! ACABA LOGO COM ISSO ANTES QUE EU TENHO UM ATAQUE!
Fábia gargalhou outra vez, e lançou mais uma granada. Dessa vez era um pouquinho maior que uma bola de golfe, o que fez Christopher engolir em seco. Por sorte, antes que ela lançasse a bomba, a moto Planária mudou bruscamente de direção, fazendo um voo vertical sinistro numa velocidade absurda. Assim, a esfera explosiva foi lançada, dando fim de uma vez à cabeça corredora. Fábia gargalhava como uma louca. Pra ela aquilo devia ser muito engraçado.
Após aquilo, a Planária viajou contrária ao sol poente durante uma hora. A Christopher foram oferecidas luvas, capacete e grossa capa de um material poderoso e desconhecido, para protegê-lo da ação da alta velocidade, a força do vento quente poderia queimar o seu rosto em poucos minutos, ou deixá-lo careca se ele fosse de costas. Logo eles planavam sobre um grande lixão, um lixão de restos robóticos gigantescos e pequenos, um lixão de velhas quinquilharias de vinte anos atrás como carros, motos, geladeiras, aeronaves e até tanques do exército. Havia ali grandes fogueiras feitas com borracha e papelão, ardendo e jogando fumaça escura no céu tingido de laranja do final da tarde. Aquela sim, era a visão do pós-apocalipse. Tudo ali era destruição.
- Onde estamos? – perguntou Christopher.
- Este lugar se chama Jazigo do Passado, onde o passado foi enterrado pra sempre, como diz a Carminha... – explicou Fábia em voz baixa – pra cá geralmente vem os robôs que já não servem pra mais nada, e pessoas também são jogadas aqui, após serem presas, condenadas e trituradas pelo tratamento de lixo de The Big Machine...
Christopher sentiu náuseas.
- Restos de pessoas são jogadas aqui como se fossem de lata?!
- Sim, isso é terrível! Há dez anos atrás, ou quinze se não me engano, o choro e a revolta eram respostas constantes à frieza e a crueldade impostas por essa nova ditadura mundial, mas agora todo mundo já tá acostumado... Porém isso ainda me enoja...
- Mas isto é... Isto é... É horrível! Onde estão os direitos humanos?! Onde está a justiça?! A piedade?! O perdão?!
- Isso não existe mais, não aqui. É tudo lei da nova religião dominante, ela criou tudo isso.
- Nova religião?
- Sim, o Maquinismo. Ou Divinismo, ou até mesmo a Supremacia. Ela prega que você deve seguir tudo o que diz A Grande Máquina, porque da Grande Máquina vem toda a verdade e é por onde Deus fala nos dias de hoje. Pois diz-se que Deus, vendo que as máquinas dominavam a mente humana, decidiu não perder os seus filhos para a tecnologia, e dela fez a sua boca... – ela parecia enojada ao dizer aquilo, uma raiva parecia a consumir como fogo naquele momento. Aquilo era mais do que asqueroso, era mais do que nojento. Era revoltante! Era o ápice da loucura e da blasfêmia, da heresia! Como Carmen pode usar o nome de Deus desse jeito para controlar a mente do mundo?! Que horrível! Aquilo era doentio, era macabro, era bizarro, assustador! Era um grande sistema de mentiras, crueldade e heresia. Christopher estava em estado de choque.
- E... Como as grandes organizações religiosas mundiais deixaram isso acontecer? O QUE HOUVE?
- Após 2012, o mundo sofreu um grande colapso. O mundo não acabou, não houve nada do que fora previsto pelo calendário Maia. Porém, as pessoas acreditavam piamente que haveria uma grande hecatombe espacial que trucidaria a vida humana no planeta terra, e começaram a agir feito loucas... Como se já não agissem assim antes! – ela parecia acanhada, assustada, intimidada ao contar aquilo – um surto de suicídios, assassinatos, roubos, destruição, incêndios, explosões... As pessoas começaram a fazer tudo o que sempre sonharam em fazer antes de o “mundo acabar”. Se lembra? Se lembra que na escola a gente sempre pergunta: “O que você faria se o mundo acabasse hoje?” e você dizia “correria pelado na rua?”.
Christopher riu.
- Sim, lembro...
- Pois é, as pessoas fizeram tudo isso... E muito mais. Se vingaram dos seus inimigos, estupraram, mataram, saquearam lojas, atiraram em presidentes e grandes líderes mundiais. Guerras eclodiram. Por exemplo, o Paquistão e a Índia não iam acabar junto com o mundo se um dois não ficasse com a região Caxemira, e estouraram bombas atômicas que destruíram e mataram milhares de pessoas em menos de cinco dias por toda a Ásia. Os Estados Unidos invadiram a Amazônia, a Rússia atacou a Romênia, os Franceses foram pra porrada com os Ingleses...
“E no Oriente Médio então? A coisa foi feia! Todos queriam a terra santa, não iriam morrer sem ter em poder o que lhes era por direito. A Bolívia invadiu o Acre e tomou as terras, a Argentina, o Uruguai e o Paraguai tomaram Rio Grande do Sul e Paraná, sem motivo algum, pra falar a verdade, eles queriam só se proteger de uma possível tropa espanhola que viria por mar e tomaria os territórios de seus países com a ajuda do Brasil, uma loucura que algum hacker idiota lançou na internet em forma de spam, e como estavam todos loucos mesmo, resolveram acreditar. Enfim, foi uma grande loucura...”
- Você se lembra disso? Então quer dizer que não foi protegida pelo sistema de raios do Maurice?
- Fui protegida sim, todos nós fomos, mas acontece que vimos tudo isso em um vídeo educativo... – ela sorriu, triste e um pouco chorosa. Os capacetes eram completamente negros e reforçados, de modo que não havia como levantar aba ou coisa qualquer que os permitissem ver sem a película. Mas no interior do capacete havia um sistema de vídeo interno de plasma holográfico que permitia cada participante do sistema ver o rosto do outro através de uma espécie de rede, numa estranha conferência. Era sinistro, mas era tão legal! – e então, quando tudo estava uma loucura e quase ninguém mais acreditava no futuro, quando uma anarquia geral dominou o mundo do Pólo Norte ao Pólo Sul, Carmen Parafuso surgiu com “A Salvação”, com sua teoria louca de Deus falando através das máquinas... E as pessoas, que não tinham mais em que acreditar, em que sustentar sua existência, resolveram aderir ao movimento, e em poucos anos uma nova sociedade estava formada... Há cinco anos ela conquistou a Ásia e a Rússia, de modo que você pode ver que é tudo muito recente e muito intenso...
- E The Big Machine é o cérebro de tudo isso... – sussurrou Christopher.
- Sim, The Big Machine funciona como uma grande CPU, que possui várias réplicas menores ao redor do globo em prédios semelhantes que meio que só reproduzem o que ela diz, como telas de monitores. Estamos todos interligados por uma rede, por um sistema opressor, por The Big Machine...
- Isso quer dizer que, para acabar com isso, é preciso explodir aquela coisa?
- Bem... É impossível entrar lá, nada orgânico entra ou sai, só robôs e máquinas.
- Não sei por que... Mas esta realidade me lembra tanto o mundo do Megaman...
- É verdade...
- Mas então como entra a comida para a Carmen?
- Nós não sabemos, nós não entendemos como isso funciona... O Chris acha que ela própria se transformou num andróide com o tempo para justamente prosseguir dominando o mundo pela eternidade...
- Como ela foi capaz disso? Ela não era Protestante?
- Era, dissestes bem, era... Quando isso começou, os Protestantes foram os primeiros a contestar as novas teorias, a tentar abrir os olhos do resto do mundo para o que estava vindo, mas ninguém deu ouvido a eles porque estavam muito descrentes... Acabou que as religiões se dividiram, e nós, o grupo da Rebelião, somos um grande misto de religiões e crenças. O mundo ficou metade pra cá e metade pra lá, está dividido, mas com o tempo nos tornamos uma minoria e isto está nos preocupando muito...
Ao dar-se conta, Christopher estava num túnel que surgira do nada, um túnel sem piso. Abaixo, dos lados e no teto, tudo eram luzes, lâmpadas redondas afastadas milimetricamente umas das outras, dispostas perfeitamente como estrelas. Eles haviam entrado no esconderijo. No esconderijo dos Revoltados. Pasmem: a Fortaleza Tecnológica de Asgard fora construída exatamente sobre Monte Dourado!

Fim da Parte Cinco!

MEEEDO! ISSO TAH FICANDO MUITO COMPRIDO!!!!


quarta-feira, 25 de novembro de 2009

THE BIG MACHINE - PARTE 4!



O vento era carregado do cheiro do ferro, o calor era insuportável, o suor já umedecia as testas dentro do forno que era aquele moinho de vento voador. Os ratos chiavam nervosos entre a sucata de aparelhos antigos eletrodomésticos e carcaças de computadores deixados para trás. Havia alguns móveis por ali, e também roupas dentro de um velho armário sem uma das portas. A palha voava, e a madeira do primeiro piso estava queimada no exato lugar em que eles surgiram vindos do passado. Christopher tinha uma sensação estranha, um embrulho horrendo no estômago, como se tivesse arregaçado a ordem das coisas na terra, como se tivesse transcendido seus limites seriamente e desobedecido perigosamente a ordem fatal das leis da natureza.
Era uma estranha sensação de não fazer parte, uma sensação molecular de se sentir deslocado, uma sensação pesada e pegajosa de estar fora do padrão natural das coisas. Não era como estar num ambiente chique estando malvestido, era como estar respirando embaixo d’água ou sobrevivendo ao fogo. No começo há certo desespero, mas depois aquilo passa, somente com o tempo.
- O Cisto do Mundo... O Vírus Maldito... A Imperatriz Escura... A Opressão Sinistra...
Pietro e Chris voltaram-se para o homem. Ele olhava fixo para o horizonte, sério e deprimido, com um olhar cansado e sofrido.
- Este são apenas alguns nomes para The Big Machine...
Christopher voltou a observar a torre sombria, que se erguia contra o céu ameaçadora, quase como se quisesse atacá-lo e perfurá-lo, era algo violento, algo anti-natural, realmente, a sensação que se tinha ao olhar para ela era a mesma sensação que Christopher tinha ao olhar para si mesmo naquele estranho lugar, que de certo modo lhe lembrava muito o vídeo do Gorillaz, Feel Good Inc. Sensação de deslocamento, como se a torre estivesse agredindo o planeta, a ordem natural.
- Quem a construiu? – questionou Pietro um pouco perturbado e enjoado – porque a Carmen que não foi. Ela não sabia nem calçar o sapato direito!
Pietro do Futuro fechou os olhos e riu, uma risada profunda e triste.
- Você é exatamente como eu me lembrava... Bons tempos... Tempos de paz...
- Ei, espera aí... Se o presente e o futuro foram alterados... – Chris agachou-se e pôs-se a analisar os restos de um aparelho celular que na época era considerado de última geração. Já nem tinha mais utilidade nenhuma – as pessoas, tanto do Presente (que no caso é Passado pra vocês) quanto no Futuro não deviam se lembrar do que aconteceu, ou conhecer outra realidade além dessa – ele esticou o aparelho para Pietro, que o pegou.
- Ele tem razão... – disse Pietro colocando a bateria de volta no Blackberry. Ele ligou.
- Acontece que, por algum motivo, fomos protegidos – começou Pietro do Futuro abrindo os olhos e colocando os estranhos óculos que lembravam muito os óculos do X-men Ciclope – eu, vocês, e o Christopher desta realidade também...
- Isso ta dando um nó na minha cabeça, eu não to mais entendendo é nada nessa porcaria! – Pietro se jogou num monte de feno. Aquilo mais parecia um celeiro!
- Tudo bem, vamos começar do início! – Christopher afastou-se da janela, puxou uma cadeira para o Pietro do Futuro e sentou-se no caixote de um ventilador industrial – você, amigo viajante do tempo, vai nos dizer exatamente o que está acontecendo, desde o princípio!
O viajante do tempo hesitou um pouco antes de se sentar, mas acabou dando de ombros e aceitando a oferta. Ali naquele campo flutuante de refugiados eles estavam seguros, pelo menos por enquanto.
- O que aconteceu foi o seguinte... – começou – esta manhã, quando eu acordei, eu já não era o mesmo... Eu estava em casa, continuava sendo um arquiteto urbanista trabalhando pra prefeitura, casado com a Augusta e pai de dois filhos...
Pietro e Christopher entreolharam-se e arregalaram os olhos! Aquilo era hilário! Pietro? Casado com Augusta? E mais, com dois, DOIS filhos! Isso que era realidade alternativa! Augusta nunca demonstrou nenhum interesse por Pietro e sempre desviou das investidas dele desde que Christopher se lembra! Os dois começaram a gargalhar no mesmo instante. O viajante até riu por alguns instantes, mas depois pediu silêncio.
- Estava tudo normal, a cidade parecia normal... Pelo menos eu achei que parecia normal – ele agora parecia confuso, como se revisse um grande choque – mas aí eles começaram a aparecer...
Fez-se silêncio. Um forte estrondo lá fora. Outra casa velha havia caído.
- Os robôs, os andróides... os cabos gigantescos de aço atravessando os prédios por dentro, os metrôs voadores, as motos planadoras... o bairro central da cidade lembra agora exatamente a estrutura de uma placa-mãe de computador, de um HD, só que todo em bronze e esmeralda puros! Por lá só vagam andróides e pessoas de classe muito alta. Os outros como eu ficam nos bairros periféricos atravessados pelas grandes tubulações de ferro e a fiação gigantesca entrelaçadas entre as construções como serpentes malignas, sanguessugas roubando energia...
“Eu freei o carro com muita força e quase atingi a Carminha... Mas não era ela... Ela estava fardada de bronze... E tinha uma expressão severa... Fui para a penitenciária... Era um andróide com o rosto dela, uma máquina perfeita em aparência, mas com a atitude completamente diferente, era algo violento e opressivo. Todos pararam na rua para olhar ela amassando o capô do meu carro, arrancando meu motor e me algemando logo em seguida... Este foi o meu primeiro encontro com uma das Células da Companhia Guardiã da Máquina... Assim eles chamam os guardas mecânicos, que são a polícia e o exército e o poder executivo e o legislativo...”.
- Espera aí... Tem gente lá fora convivendo com tudo isso?! – Christopher estava chocado, e estava se envolvendo seriamente com a história.
- Sim, algumas pessoas decidiram aderir ao sistema dela, na verdade, metade do planeta decidiu aderir ao sistema dela! Ela é uma imperatriz internacional!
A coisa era pior do que Christopher imaginara. Não só Macapá estava sob a desgraça de ser submissa ao controle de Carmen Parafuso, mas o resto do mundo inteiro! Pietro estava começando a ficar com medo, porque já tremia outra vez.
- Existem poucos que ousam contestá-la, contestar as ordens que vem de dentro da máquina e que nos são repassadas pelas Células oficiais, que são as nossas atuais governantes, robôs, andróides, pessoas artificiais com o rosto dela!
- Mas isto é TERRÍVEL!
- E como é! Fui salvo da penitenciária pelo grupo principal da Liga do Apocalipse pela tarde, mais cedo. – disse o Pietro do futuro, com mais alívio em sua expressão – Maurice, Suzannah, Ray Ann e Augusta... Sim, minha esposa também! Ela, assim como eu, fazia parte desta liga. Nós somos os únicos que não fomos afetados pelo pulso eletromagnético que atingiu o planeta nesta madrugada, e nos lembramos de tudo. Ray Ann e Maurice, que estavam acordados às cinco da manhã, viram as transformações das paisagens e das construções... O restante que dormia em casa teve de ser alertado pela manhã, e por muito azar eu não fui, pois já tinha saído de casa...
- E PORQUÊ? Nós não fomos afetados? Porque vocês não foram afetados? É isso que queremos saber! – questionava Pietro com muita dor na cabeça.
- Maurice fez muitos cursos em universidades de mecatrônica, bioengenharia e todas essas “paradas” tecnológicas que ele sempre dizia que ia fazer. Antes disso ele vinha tentando há anos criar uma máquina que protegesse a raça humana de uma extinção no caso da explosão de uma estrela próxima, ou Supernova. Esta máquina funciona com a ajuda de satélites, que emitem ondas contrárias às fatais que serão lançadas pela tempestade de energia. Atraídas por um chip que as captam, elas protegem uma residência ou até uma pessoa como uma espécie de escudo com íons negativos... – ele respirou fundo, nunca havia falado tão rápido em toda a sua vida, e estava admirado de ter decorado tanta coisa em pouco tempo – e foi assim que mantivemos a nossa memória...
Os dois garotos do passado permaneceram em silêncio, com os olhos esbugalhados feito dois peixes. Pietro foi quem primeiro falou.
- MAS HEIN?
- AH! Eu desisto! – ele lançou os braços para o ar e levantou-se da cadeira – eu não devia tê-los trazido do passado nunca! O meu dever era pedir a ajuda de vocês, para que vocês dessem um jeito de torná-la uma impopular recatada, de modo que ela não viesse a extravasar essa popularidade se tornando imperatriz mundial! – ele gritava consigo mesmo. – agora eu trouxe vocês e sabe-se lá Deus o que vai acontecer!
- Não pode simplesmente nos mandar de volta? – perguntou Pietro, tímido – porque eu não estou nem um pouco afim de enfrentar um exército de robôs com a cara de Carminha Parafuso! Já pensou, que pesadelo?!
- Mas eu ainda não entendi PORQUE eu e Pietro fomos protegidos dessa “onda” aí – Christopher estava inconsolável – não temos nada a ver com o futuro! Ainda nem chegamos a vivê-lo!
- Isso eu não sei, talvez fosse sorte... – o Outro Pietro já se acalmava mais, tornava a se sentar em sua cadeirinha de madeira.
- E mais! QUEM foi até o passado e alterou TODA a linha do TEMPO? – gritou Christopher. O Outro Pietro estancou seu ataque de nervos e engoliu em seco, agora parecia sério e arrependido. Ele escondeu o rosto com as mãos e as deslizou até o pescoço em sinal de desespero, sua boca era um fosso negro de preocupação, e seus olhos uma cascata de tristeza e arrependimento.
- Espera aí um minutinho só! – começou Christopher, levantando-se e caminhando até ele – você está sabendo de alguma coisa que ainda não nos contou!
Ele se levantou, bravo, caminhou até a janela e se debruçou no parapeito. O vento parou, e até o moinho parou de girar.
- O que você está escondendo? – perguntou Pietro, se levantando e caminhando até a janela também.
Uma explosão catastrófica surpreendeu os três, o moinho de vento foi acertado em cheio pelos fundos, o motor imediatamente entrou em combustão. Christopher foi lançado para fora, agarrando-se por reflexo numa das palhetas do moinho, que estava se desfazendo em pedaços e caindo em alta velocidade. Por detrás da chama e da fumaça surgia uma garra de metal enorme, metal velho, ferro velho corroído que rangia, era maior do que um caminhão, era um baita de um robô. Um robô de bronze velho cheio de engrenagens e placas de metal, com esmeraldas polidas no lugar dos olhos. Seu rosto de caveira imitava a face lisa e magra de Carmen, até seus dentões e seu cabelo! Uma versão gigantesca de Carminha Parafuso estava atirando contra eles, e pela boca! Através de um mini-canhão!

Fim da Parte Quatro!



segunda-feira, 23 de novembro de 2009

THE BIG MACHINE - PARTE 3!

O Pietro que surgira não só era mais magro e mais abatido como era muito, muito mais velho. De cabeça raspada e olhos pesados, mais parecia um alienígena do que o Pietro que todos conheciam, porém, haviam traços que não deixavam enganar. Aquele, de alguma forma, era Pietro, o Pietro que se encontrava ali ao lado de Christopher naquele momento, o Pietro de sempre, o que todos conhecem, de pele escura como de costume, com toda aquela altura de gigante, só que agora um pouquinho mais alto que Christopher, que na realidade é uns cinco centímetros mais alto que ele. Abatido e de olhar amargo, ele aproximou-se tirando os óculos escuros reluzentes que antes de ser reconhecido, mais parecia uma venda negra de vidro.
Christopher foi o primeiro a sair correndo, e logo em seguida os dois estavam lado a lado, gritando pelos corredores da escola, derrubando bebedouros e lixeiras. Christopher percebeu que havia algo errado quando seu amigo derrubou a tia que toma conta do portão e em seguida colocou-a de pé como se põe uma estátua que cai, pedindo desculpas depois. E então Christopher estancou, Pietro esbarrou, e os dois foram parar debaixo de um banco.
- Espera um minutinho só! – começou Chris. – É impressão minha ou você colocou a tia do corredor de pé quando ela caiu?
Fez silêncio por um minuto enquanto Pietro refletia consigo mesmo. Mas que idiotice.
- É sim... Parece que eu coloquei sim...
Os dois se arrastaram pelo chão e se puseram de pé outra vez. A escola estava em silêncio mortal. Uma mosca que passava por ali havia parado em pleno voo. Era macabro. Eles caminharam até a tia do corredor e a cutucaram. Dura que nem pedra.
- Bem que eu estava achando muito estranho ninguém ter visto ou ouvido aquela explosão dentro do banheiro... – sussurrou Pietro.
- O tempo está parado, alguém parou o tempo! Eu conheço esse efeito, já vi muitos filmes em que isso acontecia! – deduziu Chris, fanático por ficção-científica e magia.
- Por favor, pessoal, não corram! – disse uma voz pesada e sofrida – eu preciso falar com vocês!
Pietro e Christopher voltaram seus olhares para o final do corredor. Aquele estranho homem usando um uniforme preto de borracha caminhava até eles de mãos para o alto. Os dois se entreolharam muito confusos. Pietro derrubou a tia do portão outra vez, desta vez o estrondo foi tão alto que Christopher pensou que a pobre tia havia levado o farelo.
- Fique onde está! – disse Christopher, tremendo, mas tomando a iniciativa – quem é você?!
A fumaça branca e as luzes azuis brotavam do banheiro e inundavam o corredor numa maré de descargas elétricas, era como no interior de uma boate, como se um globo de luzes azuis estivesse girando e estourando ao mesmo tempo enquanto uma máquina produzia aquela conhecida fumaça dos festeiros, com cheiro de chiclete velho.
- Eu pensei que já estava óbvio! – disse ele, soltando os braços cansados ao lado do corpo.
Pietro caminhou até o estranho homem. Logo eles estavam cara a cara. Era como ver-se refletido num espelho que previa o futuro. Pietro levou a mão ao rosto e tocou sua bochecha cheia de espinhas, o homem fez o mesmo, tocando sua pele lisa e cansada.
- Você... Sou eu?! – sussurrou o garoto.
- É claro... E estou aqui para corrigir um grande erro meu... Um erro maldito... Que precisa ser corrigido o quanto antes...
- Ei, ei, EEEEEEEI!! – gritou Christopher caminhando até os dois a passos nervosos e pesados, soprando e abanando a fumaça incômoda. – você por um acaso veio do FUTURO?
O Pietro Mais Velho torceu o canto da boca e deu de ombros. O Pietro Mais Novo tentou balbuciar alguma coisa, mas Christopher o empurrou pra trás;
- Não preciso de provas para acreditar que você veio do futuro, você já deu todas as provas que precisávamos – disse ele, sério. – mas você é realmente Pietro? O nosso Pietro? Como podemos confiar em você?
- Sei que é um pouco difícil acreditar que eu não sou um dos andróides de The Big Machine, mas... – ele suspirou, encostou-se na parede e deixou-se desabar sentado no chão. Pietro e Christopher deram um passo atrás, ainda estavam muito apreensivos com aquela situação, primeiramente porque era inacreditável, e segundo por que... bem, era INACREDITÁVEL! Tudo bem, Christopher estava acostumado a lidar com aquelas coisas, desde criança cresceu rodeado por filmes, livros, histórias em quadrinhos e reportagens sobre assuntos semelhantes. Seu pai já foi ufólogo, e para ele era fácil acreditar em coisas do gênero... Até presenciá-las pessoalmente. O homem agora parecia sonolento, estava prestes a tirar uma soneca.
- Por favor, o senhor poderia se levantar e dizer, afinal de contas, do QUÊ o senhor está falando??? – Chris estava ficando irritado.
- The Big Machine é a grande máquina... – ele engoliu em seco e ofegou, estava muito cansado, viagens temporais costumam fazer isso com as pessoas – que será construída sobre os escombros desse prédio daqui a exatos 20 anos, a mando de Carmen Parafuso...
Pietro e Christopher se entreolharam e caíram na gargalhada. Ficaram rindo feito dois idiotas por mais três minutos enquanto o homem semi-adormecido os olhava com um rosto de desprezo.
- Sei como ela vai construir essa máquina! – gargalhou Chris.
- Com o dinheiro do Teddy é que ela não vai! – gargalhou Pietro. Teddy era o tão famoso namorado de Carmen, que tinha fama de valentão e marginal lá pras bandas de onde ele mora, e que agora, nessa realidade alternativa, era um Sargento.
- Ela vai usar os restos da lavadora de roupas da mãe dela! – Christopher não conseguia parar de rir. Fábia Paola em seu estado normal diria que a “caixa de risada” dele havia estourado.
- Ela vai juntar com a carcaça do aparelho de microondas do vizinho, a geladeira da tia dela e o fogão da avó, que é à lenha! – gracejou Pietro sacudindo os braços pro alto como sempre costumava fazer quando ria demais – vai grudar tudo com cola quente e vai colocar pra vender!
- Aí... HAHAHAHA... Aí... ela vai colocar pra vender! O que é isso Carminha? “Meu carro dois ponto zero da Sawary!” – Christopher já estava sentado no chão, rindo loucamente – “Mas Carmen, minha filha, Sawary é marca de calça!”.
- Aí ela vai arrancar a etiqueta da calça, vai colar na geringonça e vai dizer “Agora não é mais!”...
Mas toda aquela risada terminou no exato momento em que uma segunda explosão sacudiu a escola, que fez rolar concreto escada abaixo do terceiro andar. Uma poeira forte tomou conta de tudo, e o Pietro do Futuro arrastou os dois garotos junto consigo para dentro de uma sala aberta e vazia logo ali ao lado. Os dois não estavam entendendo nada.
- Façam silêncio! Por favor! Levem isso a sério só dessa vez! – ele ordenou que os dois fossem para os fundos da sala e ficassem lá enquanto fazia a vigília na porta. O homem puxou de seu bolso um estranho artefato, uma arma, muito semelhante a um revólver, só que branco e brilhante, parecia ser feito de um metal desconhecido, de design totalmente futurista nunca antes visto, nem nas melhores HQ’s do gênero.
- O que você acha que está acontecendo lá fora? – sibilou Pietro. Agora era ele quem estava tremendo, gelado de medo.
- Acho que algo veio atrás desse cara... E não é algo muito amistoso...
Ruídos mecânicos altos e estrondos poderosos sacudiram o prédio outra vez, sons pneumáticos, ferro retorcendo, barulhos puramente mecânicos, lembrando uma escavadeira em ação, ou uma CPU de computador gigantesca. Um brilho dourado surgiu na janelinha de vidro peliculado que ficava a altura dos olhos na porta da sala. Aquilo era metal. Parafusos, símbolos soldados e esculpidos no ferro, garras extensíveis de escorpião com as pontas curvadas para dentro. Foi então que um olho de esmeralda brilhou através do vidro, uma esmeralda perfeitamente redonda e polida, como um olho de aranha ou de cobra, gigantesco, colossal, aquilo estava arregaçando a escola por dentro.
O Pietro do futuro não ousou enfrentar aquilo que parecia um robô, correu para os fundos da sala feito um raio, segurou os braços dos garotos e apertou um botão em seu cinto metálico. Houve tempo para ver as paredes desabando. Houve tempo para ouvir alguns gritos de dor e horror, o tempo não estava mais parado. Houve apenas um tempinho para ver o besouro dourado de garras poderosas enfiar suas antenas pelas grandes rachaduras recém-feitas por ele nas paredes. Aquela coisa dourada era do tamanho de um carro, e tinha o corpo longo e brilhante, com um brasão todo em esmeralda cravado nas costas. Ele ficou de pé e rugiu, seu rugido lembrava o barulho da conexão da internet num computador antigo, e jatos de ácido foram lançados para fora das suas garras de escorpião. O robô abriu suas asas. Fibras de cristal. Mas antes que eles pudessem ver mais além daquilo, tudo já estava escuro.
- Foi impressão minha ou aquele robô estava usando sandalinhas pontudas nas seis patas?! – disse a voz tremida de Pietro num eco. Foi a primeira coisa que Christopher ouviu após o frio na barriga e a tontura.
- Ele não estava usando melissas. Os pés deles são melissas! – ralhou uma voz pesada e rancorosa que lembrava muito a de Pietro. – o que não entendo foi PORQUÊ ela mandou justamente a primeira classe dos Kabuto-Boots para atacar a escola? Um robô tão barulhento e catastrófico... Só serve para espantar guerrilheiro e sem-teto...
Tudo estava muito escuro, e o barulho de mecanismos feitos de madeira invadia os seus ouvidos. Havia também um som leve de motor, mas uma espécie de motor muito silencioso, quase um condicionador de ar.
- E agora? Vocês acreditam em mim? – perguntou a voz.
- É claro que acreditamos... – balbuciou Chris. Ele não podia se mexer, tinha medo, estava em estado de choque. Enfim ele abriu seus olhos. Tudo estava silencioso e precariamente iluminado por feixes poeirentos de luz que vinham de falhas na madeira no interior daquele grande moinho de vento. Um rato passou correndo logo ao lado. Christopher espantou-se e levantou-se bruscamente, pisando em falso, arrebentou uma tábua, levantando feno e tigelas para todo canto. Para seu desespero, não houve chão após aquilo. Apenas um nada azul celeste tenebroso. Uma grande mão agarrou seu braço antes que ele atravessasse o buraco por completo. O grito tardio de Pietro invadiu seus ouvidos.
Toda aquela luz prejudicava a sua visão já acostumada à escuridão das suas pálpebras. Uma nuvem passou logo abaixo dos seus pés, e campos quentes de serrado surgiram abaixo de si. Uma estradinha de terra passava lá entre as colinas. Ao seu redor, distantes, mas não tão longes a ponto de não serem percebidos, quase que como numa vizinhança, outros moinhos de vento em forma de torre voavam sobre motores precários semi-destruídos, cuja fiação e a tubulação já vazavam liquido de refrigeração e óleo. Um deles caiu mais ao longe, causando grande estrondo na mata abaixo, o motor falhou.
Ao seu redor haviam cabos, canos de borracha e metal que faziam muito barulho, lembravam os sistemas de instalação de uma central de ar, era assustador, como estar preso dentro de um motor de caminhão. Ele estava flutuando. Estava voando num moinho de vento voador sobre os céus de um cerrado!
- Opa! Essa foi por pouco! – riu o Pietro do futuro pela primeira vez. A madeira foi-se abaixo dos pés de Christopher Umbrella. O homem o puxou para cima, com a ajuda dos pés do garoto, é claro, 120 quilos não é pra qualquer um! Outra vez, seu coração batia forte, ele estava novamente em segurança. – ela enviou justamente o robô mais barulhento e mais perigoso porque queria me espantar do passado, queria me trazer de volta! Ela sabia que eu jamais poria a vida de adolescentes em risco... – ele socou uma viga de madeira – maldita Carmen!
Christopher e Pietro se entreolharam e caminharam para a escada de madeira que levava ao segundo andar. Ali havia uma grande janela muito antiga, do tempo do renascimento, com certeza, já não havia mais nem vidraça nela, apenas a ferragem.
Dali de cima, enquanto as palhetas do moinho não tapavam a vista ao girar, podia-se ver até o horizonte, até onde a vista chegava, um lugar muito conhecido de Chris. Cortando aquelas matas e aquele serrado estava a estradinha de terra (ainda de terra, nunca asfaltada) que ligava a capital Macapá a Laranjal do Jarí. Sobrevoada por um exército de moradias flutuantes em motores improvisados. O campo de refugiados.
No horizonte mais obscuro se erguia uma torre altíssima, colossal, medonha e metálica, o que provava que eles não estavam muito longe da cidade. Aquela torre gigantesca, cheia de cabos e objetos estranhos voando ao redor, cheia de engrenagens escuras girando sem parar, cheia de ruídos infernais, com espinhos e cistos de ferro do pé ao topo, aquela invasora, aquela intrusa construída pela ambição. Aqueça majestade com o olho de esmeralda, da cor do bronze, era a tão perigosa, a tal fatal, a tão maligna do punho de ferro...
The Big Machine!

Fim da Terceira Parte!



domingo, 22 de novembro de 2009

Hum...

Vem aí o Natal...

THE BIG MACHINE - PARTE 2!




- Oh, droga, uma espinha... – exclamou Christopher ao deparar-se com o espelho naquela manhã calma de quarta-feira. Seu ar-condicionado rugia e os passarinhos lá fora cantavam. O sol forte de cada dia já invadia a sala pelas vidraças acima das janelas de madeira, queimando logo cedo o muro de tijolos laranja onde lagartos de quintal caçavam insetos. O vento fraco da manhã batia contra as folhas do pequeno cajueiro que crescia no meio do quintal de poeira, as rolinhas já comiam as sementes das ervas-daninhas, e os periquitos gritavam. Era mais um dia comum.


Christopher entrou no carro, os olhos ainda pesados de sono, a cidade passava pela janela do carro como um vendaval de cores e formas, os outros carros faziam fila, como formigas coloridas esperando os semáforos acenderem verdes como as folhas usadas para alimentar os pulgões de um formigueiro, era hora de dar a partida outra vez.
- Bom dia... – disse ele sonolento ao sentar-se na última carteira da segunda fileira do lado direito da sala, como de costume. Era bom que o ar-condicionado não cuspisse naquela manhã. Ele não estava a fim de se molhar.
- Hum... Bom dia... – Ray Ann estava entretida com algo, resolvendo uma atividade com urgência.
- Tinha alguma atividade para hoje? – perguntou Christopher, confuso.
- Não, mas a Carmen ORDENOU que eu fizesse a dela e terminasse até a hora do intervalo, se não eu estaria completamente perdida – ela parecia confusa e um pouco revoltada com aquilo – ela quer ser a aluna número um sempre, e entregar esse trabalho ainda hoje!
Christopher riu nervoso, após ficar um pouco assustado e confuso ao mesmo tempo.
- E desde quando você tem medo da Carminha Parafuso?
- Desde sempre, Chris, e acho melhor você tratar de fazer aquela redação que ela pediu, ou...
E então ela entrou.
Usando óculos Rayban de aro dourado, calças da Gucci, jaqueta pesada de couro preto e cheia de tachas da Calvin Klein, melissinhas reluzentes douradas, unhas pintadas de vermelho, dedos pesados de anéis de ouro puro e diamantes, cabelos da mesma cor de rato molhado de sempre, só que lisos e perfeitos, argolas caríssimas da Tiffany’s nas orelhas, brilho labial de diamante, blusa baby look da Dolce&Gabbana abatida com uma bolsa exclusiva feita sobre encomenda da Hermès, ela entrou triunfal na sala de aula, esbanjando estilo, glamour e dinheiro, envolta em uma divina áurea de eterna magrice, ali estava ela, sustentada por suas tão conhecidas pernas finas, uma nova e revigorada Carmen Parafuso!
- Meu... Deus... do... Céu... – balbuciou Christopher quase caindo da cadeira – o que aconteceu aqui? A Carminha enriqueceu da noite pro dia ou o quê? Por um acaso o pai dela é o novo dono da Universal?! – exclamava ele em meio ao rebuliço da chegada da garota, a sala de aula parecia estar em festa, todos os mais populares e mais festeiros a rodeavam oferecendo atividades prontas, doces e alguns presentes, convidando-a para grandes comemorações em terrenos e mansões, era uma verdadeira loucura!
Fábia Paola tapou a boca do amigo antes que ele falasse mais besteira.
- Você está louco?! Não diga essas coisas tão alto! – exclamou ela num sibilo venenoso – é claro que tu sabes que o pai dela SEMPRE foi o dono da Universal!
Os olhos de Christopher se arregalaram.
Carminha aproximou-se, ladeada por Alexandre e Josiel Amido, talvez os mais ricos daquela sala de aula, agora eram apenas seguranças. Ela tirou seus óculos e entregou para Alexandre com delicadeza em suas mãos ossudas de dedos pontiagudos. Estava usando lentes verdes.
- Quem de vocês já terminou a atividade que eu pedi? – ela estava mais séria e esnobe do que nunca. Sempre fora assim, na verdade, mesmo quando era pobre, já era metida, e agora que estava rica havia se tornado uma verdadeira Jennifer Lopez da baixada.
Desesperados, Maurice e Ray puxaram papéis e mais papéis, entregando a ela e explicando do que cada um se tratava. Atividade de Português, revisão de Geografia, atividade de Matemática, pesquisa de História, uma penca de trabalhos todos resolvidos e formatados somente para ela, do jeito que ela queria. Christopher permaneceu calado em estado de choque esse tempo todo, mas nem isso o livrou de virar alvo da nova e poderosíssima Carmen Parafuso:
- E você? Onde está minha redação? – disse ela indicando o queixinho pontudo em sua direção. Fez-se silêncio absoluto na sala de aula. Todas as atenções estavam voltadas para aquela cena, a apreensão era quase material, visível e pesada no ambiente.
- Eu... Eu... – Christopher respirou fundo. O que ele estava fazendo? Ela era a Carmen Parafuso! A Carminha das pernas finas! A Carminha! Fechou os olhos e mandou essa:
- Eu não sei do que você está falando!
Os olhos se esbugalharam, alguém soltou uma risadinha de escárnio. Carmen tirou sua jaqueta e entregou a Josiel. Os alunos mais próximos deram um passo para trás.
- Repete o que tu disse, mano! – ordenou a Carminha.
- Ainda não entendeu? – Christopher se levantou. – EU NÃO SEI DO QUE VOCÊ ESTÁ FALANDO – disse ele pausadamente.


- Então, Senhor Umbrella... – começou a diretora – então você andou AMEAÇANDO a Senhorita Carmen Parafuso – ela meteu um Hot Cracker de pizza na boca e mascou com vontade, sujando todo o seu batom rosa bufante.
- É CLARO QUE NÃO, Odilene, você me conhece, eu jamais faria isso! – exclamou Christopher completamente revoltado, ele quase esbravejava com a diretora. – eu não sei o que está acontecendo com essa escola, eu não sei! Acho que estou vivendo algum tipo de pesadelo...
Christopher sentou-se e pôs a mão na testa. Estava quente de nervoso.
- Eu não sei o que está acontecendo a você, querido! – a diretora segurou as mãos de Christopher – você anda se comportando muito mal ultimamente, Senhor Umbrella, e agora você ameaça a Srta. Parafuso!
- Você sabe que eu não a ameacei! – ele estava à beira de um ataque de nervos, já lagrimava – eu estou tão confuso! Tem alguma coisa errada...
- E realmente tem, e esta coisa errada está em você, meu amor! – disse a diretora toda melosa, mascando outro biscoitinho – você sabe o que fez e a turma toda sabe, todos viram!
- Todos viram a injustiça que ELA fez, que ela ESTÁ fazendo! – agora ele já estava gritando. Como era possível, o que estava acontecendo? Porque a sua natureza dizia que aquilo era normal, mas o seu cérebro questionava? – todo mundo viu quando ela extorquiu de mim uma atividade de redação! Ela força as pessoas a fazerem as atividades pra ela, essa garota é um... é um... é um... É UM MONSTRO DA QUINTA AVENIDA!
Odilene mascava os seus biscoitos com muita calma enquanto entregava uma suspensão por escrito à Christopher Umbrella.
- Ameaçar uma colega de classe só porque ela pediu passagem é demais, Senhor Umbrella, você precisa urgentemente de um psicólogo. Estarei telefonando para os seus pais esta tarde! – disse a diretora gorducha fechando sua gaveta e abrindo a porta da sala – agora vá e pegue as suas coisas, está liberado da aula por hoje!
Assim que pôs os pés para fora da sala da direção, Christopher rugiu de raiva, chutou uma cadeira que caiu com estrondo e saiu pisando firme. Ainda deu tempo de ouvir Odilene gritando de dentro de sua sala minúscula “eu não disse? Eu não disse?”.
O garoto voltou para sala, apanhou suas coisas e saiu. Sua presença causara um silêncio mortal que só fora quebrado com a sua saída. Carmen estava de perninhas cruzadas e nariz em pé, esnobe como sempre, em posição de superioridade, uma superioridade que estranhamente, somente agora estava sendo respeitada. Nada de piadinhas sobre a magrice dela ou o que ela seu namorado (que, aliás, agora era um Sargento) fazem quando a Tia Parafuso está fora. Carmen havia conseguido de bandeja o que ela sempre quisera. O que quando ela exigia, todo mundo ria: Respeito.
Christopher entrou no banheiro e molhou o rosto, olhou-se no espelho e limpou a cara com a manga do casaco. Pietro saiu de um dos boxes, também tinha o rosto muito confuso e um pouco abatido. Christopher arqueou as sobrancelhas de preocupação. Pietro parecia um robô, seu olhar estava parado demais, sua postura parecia mais pesada que o normal.
- Está se sentindo bem, Pietro? – perguntou. O garoto levou a mão à testa, esfregou os olhos e apoiou-se na parede.
- Eu não sei... Eu... – de repente, ele voltou a ser o Pietro esperto de sempre, como se alguém tivesse lhe dado um chute de realidade ou injetado uma seringa de adrenalina direta na veia – é só eu ou você também acha que tem alguma coisa errada por aqui?
O coração de Christopher disparou. É, ele não estava ficando louco. Ele ficou sério, fechou a porta do banheiro às suas costas e deu passos receosos até Pietro, segurando com força a ametista pendurada em seu pescoço.
- O que você acha que tem de estranho? – balbuciou Christopher quase como num chiado. Fez-se silêncio e Pietro esfregou os olhos outra vez. Os dois estavam muito tensos e estressados. O medo pairava no ar.
- Desde quando a CARMINHA é rica?!
Christopher sorriu sinceramente pela primeira vez desde que se acordara essa manhã. Um enorme peso de bigorna foi retirado do seu peito. Aquilo era um alívio para ele, e pela primeira vez desde que conhecera o amigo, abraçou Pietro sinceramente.
- Ainda bem! Ainda bem que não sou só eu! – gritou ele, se afastando.
- Psst! Fala baixo! Fala baixo! – Pietro caminhou até a porta e colocou a cabeça para fora. O corredor estava vazio. – desde quando ela é a garota mais popular da escola?!
- Eu também me fiz a mesma pergunta! – vibrou Christopher – não sei mais o que fazer, eu estava ficando completamente louco e...
Foi então que uma forte luz invadiu o banheiro masculino. Uma luz poderosíssima, que tinha como fonte o último box. Descargas elétricas arrebentaram a porta do reservado, retorcendo-a e arrebentando-a com um impacto muito alto. O show de luzes e raios azuis e verdes era cada vez mais poderoso, labaredas e fumaça começaram a chamuscar o chão, uma esfera branca surgiu no fundo do banheiro, e após um estrondo semelhante ao barulho de um turbina de avião, uma fumaça branca tomou conta do local.
E daquela fumaça surgiu outro Pietro
Um Pietro mais magro.
Um Pietro mais abatido.
Usando um uniforme de borracha preto colado ao corpo, cheio de cintos e munições. Suas luvas de punho de ferro quase destruíram por completo o banheiro, Pietro e Christopher estavam muito assustados, loucos para correrem desembestados dali, mas algo os impedia. Uma força misteriosa os impedia de correr daquele estranho Pietro que saíra da explosão. Porque algo lhes dizia que aquilo era a sua salvação!

Fim da Segunda Parte!



quarta-feira, 18 de novembro de 2009

THE BIG MACHINE - PARTE 1!

- Eu sinceramente nunca tinha visto o Pietro daquele jeito! – disse Maurice, sentado na mesinha da carteira de Augusta. Estavam todos sentados em uma grande roda de carteiras, comum nos intervalos entre uma aula e outra, onde a conversa pode ser num volume pouco mais alto e mais abrangente. Ali são comuns as conversas paralelas em sala de aula, o que deixa os professores muitíssimo irritados, mas nada se pode fazer, pois estes são os ossos do ofício para quem tem amor à profissão, afinal de contas, os alunos de hoje em dia já não são os mesmos de antes, já não estão tão preocupados assim em assistir às aulas e tirar boas notas. O importante hoje em dia, com tanta tecnologia à disposição e oportunidades diversas, é passar de ano.
- Ele estava completamente desesperado! Andou em círculos durante um bom tempo no meio da multidão, quase chorando – enfatizou Augusta – e depois estragou total o passeio, porque ficou fazendo cara de quem chupou limão a noite inteira...
Maurice riu.
- O mais engraçado disso tudo era a cara dele quando a gente perguntava se ele ia apanhar!
- “Eu vou! Eu vou!” – imitou Augusta.
- “Do teu pai ou da tua mãe?” – perguntou Maurice.
- “Dos dois! Dos dois!” – e Augusta caiu na gargalhada.
- Esse show da Cláudia Leitte foi uma loucura... a Lois perdeu o sutiã, a Mary Ann caiu no bueiro, num instante ela tava lá, e no outro, procura a Mary, procura Mary, olha pra baixo, lá está a Mary Ann encolhidinha dentro do buraco, quê isso Mary Ann?!
Todos explodiram na risada.
- Ei, eu soube também que, numa briga, duas garotas viraram o carrinho de batata frita, e o óleo quente praticamente as fritou! – comentou Christopher, com os olhos esbugalhados.
- Foi! E na hora da muvuca, o isopor da tia da cerveja virou, e aí foi gelo pra tudo quanto é lado! – riu-se Augusta – e a tia ainda tentou espantar o pessoal que tava pulando do lado do carrinho dela, coitada!
- Mas esse Pietro... Só ele mesmo pra perder um celular de mil e quinhentos reais daquele tamanhão numa micareta dessas! – disse Christopher – como pode uma pessoa não sentir que alguém meteu a mão no seu bolso?
- Sei lá né, na hora da confusão, ninguém vê nada! Até eu pensei que fosse morrer! – argumentou Maurice – era um empurra-empurra dos diabos, pressão de todos os lados, gente sendo pisoteada, jogando cerveja, caindo uma por cima das outras...
- É por isso que eu O-D-E-I-O essas coisas... Festa, micareta, isso não dá futuro, é só gasto de dinheiro num abadá que não passa de pano velho que depois vai servir pra passar pano na casa. Além do mais, só se vai pra essas coisas quem quer ter prejuízo, como perder o celular no caso do Pietro – proclamou Christopher, quase num discurso – toda aquela gente suada, pulando, se esfregando... CREDO! Nojinho disso!
- Ah, mas isso é que o bom, hum... – piou Augusta, assanhada como sempre...



- Ai, que merda, que merda, que merda! – Pietro ainda se lamentava do ocorrido, dois dias após a festa, e não fazia ideia de como contar aos seus pais sobre a perda do tão caro telefone. A turma inteira copiava a atividade do quadro, entre comentários em chiados e risadinhas animadas pouco mais altas que um cacarejo. – nesse começo de ano eu tinha dois celulares e um MP5, agora já tenho mal um computador de HD mole! E o pior de tudo é que meus pais nem sabem que eu perdi nenhuma dessas coisas, se eles souberem, meus segundos estão contados a partir de agora!
- Tensa essa história Pietro – chiou Christopher – eu não sei por que vocês são desse jeito, os pais de vocês têm bons empregos, recebem bem todo mês, dão pra vocês tudo o que vocês querem e até coisas sem necessidade como, por exemplo, um celular de 1.500 reais, e vocês, o que fazem? Perdem, quebram, deixam levar! Na minha opinião, vocês não dão valor as coisas que tem!
- US PESSUAL NUM DÃO VALÔ ÀS COISA QUI TEM! BY CARMEN PARAFUSO! – todo mundo caiu na gargalhada. Ray Ann estava imitando a garota protestante fanática de pernas finas que vive sondando por aí, muito amiguinha de Maurice, mas que procura não se misturar com o resto do pessoal, só porque se acha melhor do que todo mundo, por ser convicta de que já tem o seu lugar no céu garantido.
- Não me venha com esse papo batido, Christopher, isso já está ficando chato! – reclamou Augusta, deixando seu caderno e sua caneta de lado por alguns instantes para se ver incluída na conversa.
- Mas é verdade, sempre que eu falo vocês me acham um chato, mas é verdade, vocês são muito folgados, deviam dar mais valor pras coisas que têm... – Christopher também largou a caneta por alguns instantes, olhou para a cabeceira da fila de cadeiras e depois para o final. – ué, a Carminha não veio hoje...
No mesmo instante, todos os outros integrantes do grupo que conversavam avidamente fizeram vistoria nas duas fileiras que pertenciam ao Apocalipse Club dentro da sala de aula, onde ninguém, apenas eles, sentavam. Era verdade, Carminha Parafuso e toda a sua magrice não compareceram à aula naquela terça-feira.
- Sabe de uma coisa? Vou dar de faltar igual uma louca agora também! – Fábia Paola que se mantivera calada até o presente momento deu uma pedrada com seu caderno tão maltratado, assustando todo mundo só de uma vez, como ela costumava fazer quando estava revoltada com alguma coisa – a Carmen quando tem feriado começa a enforcar desde quarta feira, quando na verdade o final de semana começa na sexta, e no final do ano ela ainda passa! – Fábia cruzou seus bracinhos pesados sobre seus enormes seios.
- A Paola tem razão, o professor de Geografia ainda teve coragem de passar a Carminha com sete ou oito parece, isso é uma puta duma sacanagem! – chiou Augusta.
- Por mim que se exploda Caminha e suas notas... O que eu não faria para ter meu celular de volta! O que eu não faria para não apanhar! O quê, meu Deus, o quê? Hoje eu vou pegar uma taca de peão-roxo, ai minhas costas!
Todos riram de Pietro, que permaneceu esfregando suas mãos nas costas, já sentindo a dor que estaria por vir mais tarde, quando ele resolvesse abrir o jogo com seus pais.
- Sabe de uma coisa? Sabe o que eu faria? – começou Pietro quando todo mundo já estava concentrado no assunto de história outra vez. – Quem dera eu ter uma máquina do tempo! Um dia, eu juro por Deus que vou voltar e pegar esse celular de volta! Nem que isso custe a minha vida! Quem sabe eu não viro o inventor da máquina do tempo?
- Com essas notas, eu acho difícil! – começou Maurice puxando o boletim de Pietro de baixo do caderno dele. – olha só, nem abriu o caderno ainda pra escrever o assunto!
- Ah, Maurice, não enche o saco! – Pietro puxou seu boletim de volta e prosseguiu na sua viagem de ficção científica – não, pensando melhor, eu voltaria no tempo e alteraria todo o meu passado, pra que o meu presente fique do jeito que eu quero. Eu fiz muita coisa que não queria ter feito, e me aconteceram muitas coisas também que foram cruciais pra o momento... Eu faria tudo diferente, desde o meu nascimento até agora!
- Eu também pensava assim antes! – pulou Christopher todo animado, aquele era um de seus assuntos preferidos, por isso sempre foi considerado o doido da turma, o mais retardado, porque sempre pensa muito além de todas as possibilidades, em resumo, o garoto viaja – eu sempre quis voltar no tempo e impedir que os meus pais se separassem, impedir a morte da minha bisavó, mas hoje eu vejo que essas coisas só me aconteceram para que eu me tornasse a pessoa que sou atualmente... Eu tenho medo de mudar alguma coisa e acabar como o Alexandre Amido...
Todos voltaram seus olhares felinos e disfarçados para o lado de lá da sala, para os riquinhos que vivem em festas, têm carros bonitos, dinheiro e muitas namoradas. Alexandre era o líder deles.
- Tem razão, já pensou o Christopher igual àqueles garotos? – riu Pietro, imaginando Christopher sem seus longos cabelos escuros e suas roupas extravagantes. – ia ser uma piada!
- Não se vocês me conhecessem daquele jeito... – Chris deu de ombros.
- Sem contar que tu nunca saberias se teus pais iam ser felizes juntos... – argumentou Maurice – vai ver eles tinham de se separar mesmo para não sofrer...
- É outra hipótese... Mas, que seja, eu sempre quis voltar no tempo, desde que me entendo por gente, é um dos meus grandes sonhos – os olhos de Christopher brilhavam.
- Não se preocupe, quando eu inventar a máquina do tempo, vamos todos fazer uma viagem juntos, e eu recuperarei meu celular e não levarei uma surra! – disse Pietro levantando seu punho no ar.
- É claro que vai levar uma surra, Pietro! – todos olharam confusos para Christopher. – é claro gente, vejam só: o Pietro do futuro iria até o passado, na noite e na hora em que o Pietro do passado perdeu o celular, e pegaria o aparelho antes que ele perdesse, no caso, se caísse no chão, e levaria de volta para o futuro, e então estaria explicada a situação: Pietro nunca perdeu seu telefone, o Pietro do futuro foi quem voltou e o pegou antes que alguém pisasse nele no meio da multidão e o levou para a sua época...
- E assim eu continuaria sem telefone e pegaria uma surra mesmo assim! – admirou-se Pietro, arregalando seus olhões brancos – que legal!... bom, quer dizer, só tecnicamente, porque eu continuaria condenado a apanhar...
- Isso deu foi um nó na minha cabeça isso sim! Vamos estudar manos! – começou Augusta.
Aquele dia passou rápido demais, e antes que Christopher percebesse, já estava dormindo...
Nunca em toda a sua existência, ele foi capaz de se preparar para o que viria. Nunca, jamais, em suas viagens imaginárias entre dimensões e hipóteses e mundos diferentes ele pode chegar a conclusões tão absurdas e catastróficas como aquelas que a maldita manhã seguinte lhe guardavam. É tudo tão caótico e tudo tão confuso. Tudo parece tão cômico, mas tão desesperador... Abrir os olhos numa quarta feira normal e ensolarada na cidade infernal e calorenta de Macapá, onde o sol te queima até os ossos, se olhar no espelho e dar conta de que já não é mais o mesmo...

Fim da Primeira Parte!


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