Bem vindos à minha fábrica de sonhos!

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

THE BIG MACHINE - PARTE 3!

O Pietro que surgira não só era mais magro e mais abatido como era muito, muito mais velho. De cabeça raspada e olhos pesados, mais parecia um alienígena do que o Pietro que todos conheciam, porém, haviam traços que não deixavam enganar. Aquele, de alguma forma, era Pietro, o Pietro que se encontrava ali ao lado de Christopher naquele momento, o Pietro de sempre, o que todos conhecem, de pele escura como de costume, com toda aquela altura de gigante, só que agora um pouquinho mais alto que Christopher, que na realidade é uns cinco centímetros mais alto que ele. Abatido e de olhar amargo, ele aproximou-se tirando os óculos escuros reluzentes que antes de ser reconhecido, mais parecia uma venda negra de vidro.
Christopher foi o primeiro a sair correndo, e logo em seguida os dois estavam lado a lado, gritando pelos corredores da escola, derrubando bebedouros e lixeiras. Christopher percebeu que havia algo errado quando seu amigo derrubou a tia que toma conta do portão e em seguida colocou-a de pé como se põe uma estátua que cai, pedindo desculpas depois. E então Christopher estancou, Pietro esbarrou, e os dois foram parar debaixo de um banco.
- Espera um minutinho só! – começou Chris. – É impressão minha ou você colocou a tia do corredor de pé quando ela caiu?
Fez silêncio por um minuto enquanto Pietro refletia consigo mesmo. Mas que idiotice.
- É sim... Parece que eu coloquei sim...
Os dois se arrastaram pelo chão e se puseram de pé outra vez. A escola estava em silêncio mortal. Uma mosca que passava por ali havia parado em pleno voo. Era macabro. Eles caminharam até a tia do corredor e a cutucaram. Dura que nem pedra.
- Bem que eu estava achando muito estranho ninguém ter visto ou ouvido aquela explosão dentro do banheiro... – sussurrou Pietro.
- O tempo está parado, alguém parou o tempo! Eu conheço esse efeito, já vi muitos filmes em que isso acontecia! – deduziu Chris, fanático por ficção-científica e magia.
- Por favor, pessoal, não corram! – disse uma voz pesada e sofrida – eu preciso falar com vocês!
Pietro e Christopher voltaram seus olhares para o final do corredor. Aquele estranho homem usando um uniforme preto de borracha caminhava até eles de mãos para o alto. Os dois se entreolharam muito confusos. Pietro derrubou a tia do portão outra vez, desta vez o estrondo foi tão alto que Christopher pensou que a pobre tia havia levado o farelo.
- Fique onde está! – disse Christopher, tremendo, mas tomando a iniciativa – quem é você?!
A fumaça branca e as luzes azuis brotavam do banheiro e inundavam o corredor numa maré de descargas elétricas, era como no interior de uma boate, como se um globo de luzes azuis estivesse girando e estourando ao mesmo tempo enquanto uma máquina produzia aquela conhecida fumaça dos festeiros, com cheiro de chiclete velho.
- Eu pensei que já estava óbvio! – disse ele, soltando os braços cansados ao lado do corpo.
Pietro caminhou até o estranho homem. Logo eles estavam cara a cara. Era como ver-se refletido num espelho que previa o futuro. Pietro levou a mão ao rosto e tocou sua bochecha cheia de espinhas, o homem fez o mesmo, tocando sua pele lisa e cansada.
- Você... Sou eu?! – sussurrou o garoto.
- É claro... E estou aqui para corrigir um grande erro meu... Um erro maldito... Que precisa ser corrigido o quanto antes...
- Ei, ei, EEEEEEEI!! – gritou Christopher caminhando até os dois a passos nervosos e pesados, soprando e abanando a fumaça incômoda. – você por um acaso veio do FUTURO?
O Pietro Mais Velho torceu o canto da boca e deu de ombros. O Pietro Mais Novo tentou balbuciar alguma coisa, mas Christopher o empurrou pra trás;
- Não preciso de provas para acreditar que você veio do futuro, você já deu todas as provas que precisávamos – disse ele, sério. – mas você é realmente Pietro? O nosso Pietro? Como podemos confiar em você?
- Sei que é um pouco difícil acreditar que eu não sou um dos andróides de The Big Machine, mas... – ele suspirou, encostou-se na parede e deixou-se desabar sentado no chão. Pietro e Christopher deram um passo atrás, ainda estavam muito apreensivos com aquela situação, primeiramente porque era inacreditável, e segundo por que... bem, era INACREDITÁVEL! Tudo bem, Christopher estava acostumado a lidar com aquelas coisas, desde criança cresceu rodeado por filmes, livros, histórias em quadrinhos e reportagens sobre assuntos semelhantes. Seu pai já foi ufólogo, e para ele era fácil acreditar em coisas do gênero... Até presenciá-las pessoalmente. O homem agora parecia sonolento, estava prestes a tirar uma soneca.
- Por favor, o senhor poderia se levantar e dizer, afinal de contas, do QUÊ o senhor está falando??? – Chris estava ficando irritado.
- The Big Machine é a grande máquina... – ele engoliu em seco e ofegou, estava muito cansado, viagens temporais costumam fazer isso com as pessoas – que será construída sobre os escombros desse prédio daqui a exatos 20 anos, a mando de Carmen Parafuso...
Pietro e Christopher se entreolharam e caíram na gargalhada. Ficaram rindo feito dois idiotas por mais três minutos enquanto o homem semi-adormecido os olhava com um rosto de desprezo.
- Sei como ela vai construir essa máquina! – gargalhou Chris.
- Com o dinheiro do Teddy é que ela não vai! – gargalhou Pietro. Teddy era o tão famoso namorado de Carmen, que tinha fama de valentão e marginal lá pras bandas de onde ele mora, e que agora, nessa realidade alternativa, era um Sargento.
- Ela vai usar os restos da lavadora de roupas da mãe dela! – Christopher não conseguia parar de rir. Fábia Paola em seu estado normal diria que a “caixa de risada” dele havia estourado.
- Ela vai juntar com a carcaça do aparelho de microondas do vizinho, a geladeira da tia dela e o fogão da avó, que é à lenha! – gracejou Pietro sacudindo os braços pro alto como sempre costumava fazer quando ria demais – vai grudar tudo com cola quente e vai colocar pra vender!
- Aí... HAHAHAHA... Aí... ela vai colocar pra vender! O que é isso Carminha? “Meu carro dois ponto zero da Sawary!” – Christopher já estava sentado no chão, rindo loucamente – “Mas Carmen, minha filha, Sawary é marca de calça!”.
- Aí ela vai arrancar a etiqueta da calça, vai colar na geringonça e vai dizer “Agora não é mais!”...
Mas toda aquela risada terminou no exato momento em que uma segunda explosão sacudiu a escola, que fez rolar concreto escada abaixo do terceiro andar. Uma poeira forte tomou conta de tudo, e o Pietro do Futuro arrastou os dois garotos junto consigo para dentro de uma sala aberta e vazia logo ali ao lado. Os dois não estavam entendendo nada.
- Façam silêncio! Por favor! Levem isso a sério só dessa vez! – ele ordenou que os dois fossem para os fundos da sala e ficassem lá enquanto fazia a vigília na porta. O homem puxou de seu bolso um estranho artefato, uma arma, muito semelhante a um revólver, só que branco e brilhante, parecia ser feito de um metal desconhecido, de design totalmente futurista nunca antes visto, nem nas melhores HQ’s do gênero.
- O que você acha que está acontecendo lá fora? – sibilou Pietro. Agora era ele quem estava tremendo, gelado de medo.
- Acho que algo veio atrás desse cara... E não é algo muito amistoso...
Ruídos mecânicos altos e estrondos poderosos sacudiram o prédio outra vez, sons pneumáticos, ferro retorcendo, barulhos puramente mecânicos, lembrando uma escavadeira em ação, ou uma CPU de computador gigantesca. Um brilho dourado surgiu na janelinha de vidro peliculado que ficava a altura dos olhos na porta da sala. Aquilo era metal. Parafusos, símbolos soldados e esculpidos no ferro, garras extensíveis de escorpião com as pontas curvadas para dentro. Foi então que um olho de esmeralda brilhou através do vidro, uma esmeralda perfeitamente redonda e polida, como um olho de aranha ou de cobra, gigantesco, colossal, aquilo estava arregaçando a escola por dentro.
O Pietro do futuro não ousou enfrentar aquilo que parecia um robô, correu para os fundos da sala feito um raio, segurou os braços dos garotos e apertou um botão em seu cinto metálico. Houve tempo para ver as paredes desabando. Houve tempo para ouvir alguns gritos de dor e horror, o tempo não estava mais parado. Houve apenas um tempinho para ver o besouro dourado de garras poderosas enfiar suas antenas pelas grandes rachaduras recém-feitas por ele nas paredes. Aquela coisa dourada era do tamanho de um carro, e tinha o corpo longo e brilhante, com um brasão todo em esmeralda cravado nas costas. Ele ficou de pé e rugiu, seu rugido lembrava o barulho da conexão da internet num computador antigo, e jatos de ácido foram lançados para fora das suas garras de escorpião. O robô abriu suas asas. Fibras de cristal. Mas antes que eles pudessem ver mais além daquilo, tudo já estava escuro.
- Foi impressão minha ou aquele robô estava usando sandalinhas pontudas nas seis patas?! – disse a voz tremida de Pietro num eco. Foi a primeira coisa que Christopher ouviu após o frio na barriga e a tontura.
- Ele não estava usando melissas. Os pés deles são melissas! – ralhou uma voz pesada e rancorosa que lembrava muito a de Pietro. – o que não entendo foi PORQUÊ ela mandou justamente a primeira classe dos Kabuto-Boots para atacar a escola? Um robô tão barulhento e catastrófico... Só serve para espantar guerrilheiro e sem-teto...
Tudo estava muito escuro, e o barulho de mecanismos feitos de madeira invadia os seus ouvidos. Havia também um som leve de motor, mas uma espécie de motor muito silencioso, quase um condicionador de ar.
- E agora? Vocês acreditam em mim? – perguntou a voz.
- É claro que acreditamos... – balbuciou Chris. Ele não podia se mexer, tinha medo, estava em estado de choque. Enfim ele abriu seus olhos. Tudo estava silencioso e precariamente iluminado por feixes poeirentos de luz que vinham de falhas na madeira no interior daquele grande moinho de vento. Um rato passou correndo logo ao lado. Christopher espantou-se e levantou-se bruscamente, pisando em falso, arrebentou uma tábua, levantando feno e tigelas para todo canto. Para seu desespero, não houve chão após aquilo. Apenas um nada azul celeste tenebroso. Uma grande mão agarrou seu braço antes que ele atravessasse o buraco por completo. O grito tardio de Pietro invadiu seus ouvidos.
Toda aquela luz prejudicava a sua visão já acostumada à escuridão das suas pálpebras. Uma nuvem passou logo abaixo dos seus pés, e campos quentes de serrado surgiram abaixo de si. Uma estradinha de terra passava lá entre as colinas. Ao seu redor, distantes, mas não tão longes a ponto de não serem percebidos, quase que como numa vizinhança, outros moinhos de vento em forma de torre voavam sobre motores precários semi-destruídos, cuja fiação e a tubulação já vazavam liquido de refrigeração e óleo. Um deles caiu mais ao longe, causando grande estrondo na mata abaixo, o motor falhou.
Ao seu redor haviam cabos, canos de borracha e metal que faziam muito barulho, lembravam os sistemas de instalação de uma central de ar, era assustador, como estar preso dentro de um motor de caminhão. Ele estava flutuando. Estava voando num moinho de vento voador sobre os céus de um cerrado!
- Opa! Essa foi por pouco! – riu o Pietro do futuro pela primeira vez. A madeira foi-se abaixo dos pés de Christopher Umbrella. O homem o puxou para cima, com a ajuda dos pés do garoto, é claro, 120 quilos não é pra qualquer um! Outra vez, seu coração batia forte, ele estava novamente em segurança. – ela enviou justamente o robô mais barulhento e mais perigoso porque queria me espantar do passado, queria me trazer de volta! Ela sabia que eu jamais poria a vida de adolescentes em risco... – ele socou uma viga de madeira – maldita Carmen!
Christopher e Pietro se entreolharam e caminharam para a escada de madeira que levava ao segundo andar. Ali havia uma grande janela muito antiga, do tempo do renascimento, com certeza, já não havia mais nem vidraça nela, apenas a ferragem.
Dali de cima, enquanto as palhetas do moinho não tapavam a vista ao girar, podia-se ver até o horizonte, até onde a vista chegava, um lugar muito conhecido de Chris. Cortando aquelas matas e aquele serrado estava a estradinha de terra (ainda de terra, nunca asfaltada) que ligava a capital Macapá a Laranjal do Jarí. Sobrevoada por um exército de moradias flutuantes em motores improvisados. O campo de refugiados.
No horizonte mais obscuro se erguia uma torre altíssima, colossal, medonha e metálica, o que provava que eles não estavam muito longe da cidade. Aquela torre gigantesca, cheia de cabos e objetos estranhos voando ao redor, cheia de engrenagens escuras girando sem parar, cheia de ruídos infernais, com espinhos e cistos de ferro do pé ao topo, aquela invasora, aquela intrusa construída pela ambição. Aqueça majestade com o olho de esmeralda, da cor do bronze, era a tão perigosa, a tal fatal, a tão maligna do punho de ferro...
The Big Machine!

Fim da Terceira Parte!



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